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Arieli Groff

Por que as crianças fazem birra?

As tão temidas crises são momentos naturais do desenvolvimento emocional das crianças. Entenda o porquê e o que fazer nessas situações

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Choro intenso no meio do restaurante, rolar no chão em pleno shopping, sapatear, gritar, se debater, são cenas que muitas vezes acontecem na proporção direta ao temor de mães e pais. Em maior ou menor grau, já nos pegamos julgando situações assim, com expressões como “essa criança não tem mãe? Como deixam fazer isso? Que pais moles, não colocam limites.” Até que nos tornamos mães, e esses momentos passam na mente como um trailer de terror, algo a ser evitado com todas as forças e rezas para que não sejamos nós as mães a serem julgadas pelos outros.

As famosas e temidas crises de birras, costumam ocupar um lugar de rechaço e pouca empatia, tanto por quem está de fora mas também por mães e pais, que sentem raiva, são levados aos seus limites de paciência, se sentem incompetentes em seus papéis e percebem a exaustão se instalar de forma constante. Mas afinal, por que as crianças fazem birra?

Para entender essa expressão intensa por parte das crianças, precisamos olhar para o funcionamento de seus cérebros nesse momento fundamental do desenvolvimento infantil.

Vamos imaginar o cérebro como uma casa de dois andares. No andar de baixo, temos o cérebro mais primitivo, instintivo, responsável pelas emoções, respostas automáticas, onde a ação acontece antes do pensamento. Esse cérebro está já desenvolvido no momento do nascimento do bebê. Já o andar de cima, é mais sofisticado, complexo, responsável pela regulação das emoções, empatia, onde é possível que o pensamento ocorra antes do agir e que estará em desenvolvimento até por volta dos vinte e cinco anos de idade.

Cérebro em construção, emoções também

Como então esperar que uma criança regule suas emoções se a parte do cérebro responsável por isso estão em plena construção? Para compreendermos na prática como essa estrutura cerebral se reflete nas ações da criança, vamos imaginar uma situação de afogamento. Uma pessoa que se afoga, se vê rodeada de água, instintivamente se debate na tentativa de sair daquela situação a qual gera medo, ansiedade e impotência. Com a criança que vive uma crise de birra acontece o mesmo, porém, no lugar da água, temos as emoções. A criança se vê inundada geralmente por medo, frustração, raiva e  tristeza, emoções essas que seu cérebro ainda não está preparado para regular, pois está em desenvolvimento. Por isso, muitas vezes as crianças se jogam no chão, rolam e sapateiam, na tentativa instintiva de se livrar de algo que as invade sem que tenham condições de controlar. Como a pessoa que se afoga, precisamos retirá-la dessa situação, jogar a boia e salvá-la. Como fazer isso?

Toda birra é uma comunicação

Entender o funcionamento cerebral e o que acontece no momento da birra é um primeiro e importante passo para conseguirmos olhar para as crianças com mais empatia, compreendendo que toda manifestação intensa de emoções é uma comunicação, um pedido de ajuda da criança que diz “por favor me ajuda, está difícil para mim / não consigo sozinha / estou assustada / preciso de você.” Assim como um afogamento, quem está envolto pela água não precisa de julgamento, precisa ser salvo. A criança também, e por isso o tal do sermão costuma não funcionar, além de gerar cansaço e frustração nos pais e também na criança, pois ele está sendo aplicado no momento errado.

Como agir no momento da birra?

Jogar a boia significa criar conexão com a criança, ou seja, validar o que ele sente, expressar acolhimento, nomear o sentimento que está presente, seja medo, raiva,... pois o cérebro responsável por fazer isso ainda não está pronto. Criança acolhida consegue se regular, restabelecer o equilíbrio, ainda que possa levar de minutos até horas. Após ter estabilizado, e somente após, podemos então entrar com a razão e conversar sobre o acontecido, com muito afeto e buscando junto com a criança pensar em respostas possíveis quando algo semelhante ocorrer novamente.

Acolher nossos filhos em momentos de emoções intensas é ajudá-los a construir a escada do cérebro, que os levará a ter acesso ao andar de cima, auxiliando em uma vida de equilíbrios e mais feliz.

por Arieli Groff

Arieli Groff é mãe da Maitê e psicóloga, especializada em Luto Adulto e Infantil e Teoria do Apego. Idealizadora do Instituto Pirilampos voltado para maternidade e infância. autora e organizadora dos livros “Quando uma mãe nasce”, “Que medo é esse?” e “Toda mãe tem histórias para contar”.


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