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Madeleine Muller

Como estará a moda em 2024?

O futuro da moda e do nosso planeta depende das nossas ações hoje

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Estava eu pesquisando sobre a moda daqui dois anos, tentando compor um futuro possível e sustentável nesse momento tão complexo de reestruturação do setor como um todo, e confesso que há um bombardeio de informações disponíveis, algumas pessimistas, outras otimistas, dependendo da interpretação...Resta saber em que metade do copo queremos ficar, no meio cheio ou no meio vazio. Simples assim.

Eu enquanto professora de design, produtora de moda e observadora dos sinais, só queria ser realista e entender melhor os comportamentos de consumo, olhando para alguns relatórios previsores de cenários, ouvindo as marcas e os consumidores, o que ajuda a pensar melhor onde estamos e para onde vamos. Segundo a WGSN, empresa líder mundial em serviços de pesquisa e análises de tendências para diversos segmentos (não apenas a moda), 2024 será um ponto de transição muito importante para essa indústria.

Observando os sinais

De roupas adaptáveis ao clima, partindo para a preparação da entrada no metaverso e a criação de serviços de manutenção e conserto, destacam-se, segundo a empresa, seis principais tendências que influenciarão a produção de têxteis e vestuário, baseadas na observação de especialistas, atrelada à metodologia STEPIC, que analisa mudanças na Sociedade, Tecnologia, Meio ambiente (environment), Política, Indústria e Criatividade. São dados, não bola de cristal, mas sujeitos à mudança, concretizando-se ou não, num mundo em constante (e rápida) evolução.

As seis tendências previstas para 2024 partem de três temas em comum: uma consciência mais clara da nossa interdependência, um forte anseio por comunidade e uma rejeição generalizada do 'normal'. As seis grandes ideias para 2024 são:

• Práticas de cuidado: com muitas pessoas priorizando o bem-estar ao invés do trabalho, chegou a hora de dizer adeus à cultura da pressa e abraçar a cultura do cuidado. Essa cultura também se manifesta através da fraternidade, levando a construir relações de interesse efetivo pelo bem do próximo, e a superar a cultura da indiferença e do descarte.

• Realidades fluidas: na medida em que o consumidor se habitua aos mundos virtuais, os itens digitais se tornam tão importantes quanto os produtos físicos. Porém, é importante manter os vínculos afetivos e lembrar que confiança, fidelidade e humanização precisam estar tanto no on quanto no off line.

• Protopias em ação: o mundo espera que as empresas promovam mudanças radicais para combater a crise climática, e as protopias podem ser a solução. A saber: protopia é o meio-termo entre utopia e distopia, buscando focar no presente para a construção do futuro, baseado nas escolhas diárias. Nem perfeita, nem catastrófica, a sociedade protópica depende de ações conscientes, aqui e agora.

• Poder coletivo em transformação: a diversidade servirá de combustível para a união, dando origem a designs democráticos, iniciativas colaborativas e plataformas baseadas em valores. Falar em diversidade significa incluir etnia, orientação sexual, identidade de gênero, condição socioeconômica, status marital, deficiências, idade e muitas outras nuances. Não é simples, requer um olhar múltiplo, com possibilidade de alinhar o discurso à prática, de forma transparente e efetiva.

• Designs democráticos: marcas e consumidores vão abrir mão do ‘normal’ em nome de designs mais personalizados e inclusivos, que atendam a todos. É importante salientar que a roupa também funciona como um instrumento de inserção em contextos sociais, já que o vestuário acompanha todas as transformações, interações e processos históricos da raça humana. A retomada do conceito do Design Universal, termo cunhado em 1985.

• Novos códigos: ao fim da pandemia, uma injeção de criatividade irá inspirar designers a romper com velhos códigos e investir em novas parcerias, tudo isso com participação ativa do público consumidor. Já há marcas fazendo coleções com usuários do TikTok, por exemplo, baseadas em suas sugestões, o que permite vantagens ao negócio, já que as taxas de devolução diminuem, há maior giro da coleção e potencial de mais conteúdo gerado pelo cliente pois ele se sente parte da marca.

Concluindo (mas o tema segue em aberto)

Ok, pessoal, tudo isso é muito interessante mas precisamos pensar em termos de consumo, pois essas tendências não afetam apenas as empresas, que estão buscando novos posicionamentos no mercado, mas também os consumidores, em seus contextos de vida, na forma como se relacionam com a moda. O que nós todos, que nos vestimos todos os dias, que somos apaixonados por moda, podemos fazer para manter um equilíbrio saudável entre o que se produz e o que se consome?

É importante manter nosso guarda-roupa atualizado (invista em formas de uso) e representativo da nossa identidade, mas, para isso, não precisamos consumir desenfreadamente. Existem diversas formas de estar por dentro das novidades do mercado, sem aumentar o consumo. Uma delas é comprar em brechó: optar por uma peça que já existe é mais econômico e responsável, desafie-se a essa experiência.

Outra forma ecologicamente correta é o aluguel de roupas e acessórios. Há várias iniciativas nesse sentido e ninguém precisa estar comprando algo novo a cada festa, dá para alugar e estar sempre com um look incrível e diferente. Ou fazer em casa, se tiver os dotes. Ou renovar, consertar o que já se tem na costureira.

Assim evitamos que toneladas de roupas indesejadas (pelos mais variados motivos) sejam descartadas, e pior, não recicladas. Todos já estão suficientemente informados dos cemitérios têxteis em Gana e no deserto do Atacama, vale pensar aqui em compartilhar os nossos armários e contribuir para a economia circular- este é um dos passos em direção a um futuro mais sustentável na moda, desafiando a linha de produção linear da indústria que termina com as roupas sendo descartadas em aterros sanitários, antes do fim de sua vida útil.

O futuro da moda e do nosso planeta depende das nossas ações hoje: vamos reciclar nossos comportamentos?

Fonte: www.wgsn.com

por Madeleine Muller

Madeleine Muller é produtora, professora no curso de Design de Moda da ESPM, stylist e mãe da Alexia e do André. Pesquisa o consumo consciente da moda e é autora do livro Admirável Moda Sustentável. Escreve quinzenalmente para o Bella Mais. Acompanhe seu dia a dia pelo Insta: @Madi_muller


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