A importância da criatividade e do novo nem sempre tão novo da moda

É comum ouvir queixas de que na moda nada se cria, tudo se copia - será? Lendo o livro de Austin Kleon, “Roube como um artista”, entendemos que nada vem do nada. Todo trabalho criativo é construído sobre o que veio antes. Nada (ou quase) é totalmente original e é normal sermos influenciados pelo trabalho ou estilo de alguém que gostamos, ou alguém que veio antes.

A questão é que toda nova ideia é um mashup (ou remix) de uma ou mais ideias anteriores, mas mesmo assim nós as modificaremos a partir do nosso olhar para elas, e esse olhar tem a ver com o repertório que construímos durante nossa vida. Podemos aprender com os grandes mestres, nos inspirar neles, desde a arte até a moda, os grandes criadores, as grandes marcas- inspirar-se não é copiar, é buscar seu próprio jeito de (re)fazer o que já foi feito, é fazer sua própria tradução.

Muitos profissionais da indústria da moda olham para as marcas novidadeiras, como Gucci e Balenciaga, apenas para citar duas que se reinventaram, observando seus lançamentos - trazendo novas tendências a cada temporada - e questionam-se sobre o processo de criação e desenvolvimento de produtos que viram fenômenos de vendas. De onde, enfim, parte a inspiração criativa delas? Para isso, não existe segredo: existe método.

Um dos principais fatores que contribuem para o sucesso das coleções baseia-se não só nas fontes de inspiração dos criadores, mas também na diversidade de fontes que eles consomem. É óbvio que conhecer bem o mercado e seu público deve estar na conta dessa criatividade toda, a não ser que se esteja fora do circuito comercial, sem a pressão da venda, mas isso já é tema para outra coluna.

Mas afinal, o que é repertório?

O repertório é todo conhecimento adquirido e acumulado por meio da experiência do indivíduo, seja ele em ambiente pessoal ou profissional. Ou seja, tudo aquilo que já se viu, ouviu, aprendeu, conheceu e, de alguma forma, assimilou. Cada indivíduo, dessa forma, vai criando uma bagagem que fortalece ainda mais seu conhecimento e permite que as inspirações sejam uma interpretação das referências à sua maneira.

A inspiração pode vir do próprio repertório pessoal de vida, mas também pode ser buscada propositalmente através de pesquisa. Não existe certo ou errado, mas sim o que funciona melhor em cada processo criativo, para o cliente que se está atendendo, ou para seu próprio projeto profissional.

E a inspiração, vem de onde?

A inspiração está por todos os lados mas também dentro de cada um, ela aborda algo a respeito de tudo o que já se viu e viveu, e essa bagagem de referências é primordial para criar uma coleção ou uma peça que seja realmente surpreendente e criativa, uma vez que ao colocar uma visão de mundo e referências nos produtos, se faz com que eles sejam ainda mais originais e diferenciados.

Exemplos de repertório pessoal são os lugares que se frequentou em viagens, a bagagem cultural adquirida através de livros, filmes, músicas, exposições, arte, arquitetura. E, claro, o que se vê nas ruas, nos grupos sociais, onde um simples passeio ao centro da cidade ou à praça de alimentação de um shopping qualquer já dá para ter uma boa ideia do mood, da vibe do momento, o que as pessoas estão vestindo, gostando e expressando, do jeito delas. É o tal espírito do tempo, e ele só se revela para olhos antenados. Sim, há que se prestar atenção aos sinais, ficar atento, treinar o olho....

É preciso pesquisar!

A pesquisa é uma parte essencial de qualquer empresa, negócio ou projeto na área da indústria criativa, uma vez que ela é uma forma de construção de conhecimento e informações, parte essencial do processo de design. Sendo assim, a inspiração da moda é o resultado da pesquisa criativa, ou seja, é a origem e a coleta de ideias antes do design e da criação. Alguns exemplos de pesquisa criativa na área da moda:

PESQUISA EXPERIMENTAL E INVESTIGATIVA- É recomendado que a pesquisa criativa seja feita por experimentação e investigação, a qual possui como principal objetivo a obtenção de insights e ideias iniciais.

HISTÓRIAS/ NARRATIVA- Sendo a pesquisa uma ferramenta essencial para o processo criativo, ela fornece informações e direcionamentos, além de auxiliar na criação de narrativa e história para o desenvolvimento da coleção.

TEMA DA COLEÇÃO- Aqui a inspiração é muito importante pois é com base no tema que algumas características de estilo são definidas. Um tema bem elaborado deixa a coleção mais coerente e possibilita a criação de uma história criativa.

DISCIPLINA E PRÁTICA- Como em qualquer trabalho que envolva a criatividade, é preciso constância na busca e observação dos sinais de mudança, além de disciplina e prática para canalizar as inspirações em algo concreto, e não apenas no plano das ideias.

Como fazer algo que já não tenha sido feito

Só é novo se foi feito de outro jeito, sob outra perspectiva, com outra tecnologia. Uma calça jeans será sempre uma calça jeans mas poderá sofrer n-inovações e interferências estéticas. Mesmo bebendo nas mesmas fontes de outros, cada interpretação é única, quando o designer coloca um pouco de si e da sua própria visão no que está fazendo. Pode-se buscar inspiração em, literalmente, tudo.

Fundamental é saber para onde olhar - e, quando olhar, entender o que é relevante e faz sentido na sua criação. Um criador deve se alimentar de vida e sair da sua “bolha” para enxergar além. Caso isso não ocorra, pode ser que ele fique realmente preso no que já existe no mercado, consequentemente, correndo o risco de ser mais um entre os demais, sem, de fato, conseguir se diferenciar.

O próprio mundo é uma fonte de inspiração, da natureza à realidade urbana, em tudo o que nos rodeia. Dessa forma, podemos identificar materiais, cores para desenhar ou redesenhar (fazer o novo de novo) ou novas linhas de produtos de moda, inclusive os que partem de reuso ou reciclagem de materiais que já existem.  

Dicas finais:

       • A inspiração pode vir de qualquer lugar

       • Buscar uma abordagem ampla, depois focar

       • Diversificar as fontes

      • Estar sempre aberto para aprender

Para finalizar, lembro que na moda somos eternos coletores, pegamos algo aqui e ali o tempo todo, vamos armazenando. É muito importante que se crie o hábito de coletar imagens, ideias e até mesmo pensamentos dispersos, porque em algum momento o que parece solto se conecta, e lá está: a criação começa a nascer!

Fonte: www.wgsn.com