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Madeleine Muller

Será que a moda conseguirá realmente ser sustentável?

Marcas do mundo todo estabeleceram metas até 2030

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Um relatório recente analisou 47 grandes empresas de moda no que diz respeito às emissões de carbono e chegou à conclusão de que "não existe moda sustentável", uma vez que elas não vão conseguir reduzir para a metade as respectivas emissões até 2030. E porque 2030? Esse foi o prazo estabelecido para o cumprimento das 17 ODS da ONU, num plano de ação para as pessoas, o planeta e a prosperidade, buscando fortalecer a paz universal. 

A Agenda 2030 foi criada para erradicar a pobreza e promover vida digna para todos, dentro dos limites do planeta, tendo objetivos e metas claras, para que todos os países adotem de acordo com suas próprias prioridades e atuem numa parceria global que oriente as escolhas necessárias para melhorar a vida de todos, agora e no futuro.

A moda também aderiu através do Fashion Pact, acordo assinado na França em 2019 sob a iniciativa do Presidente Macron, convocando marcas da indústria da moda a se comprometerem em prol do meio ambiente, seja eliminando o uso de plásticos de uso único, seja adotando exclusivamente fontes de energia renovável, promovendo práticas de agricultura regenerativa e reciclagem de tecidos, dentre outros. 

Ora, essa pressão já está partindo dos próprios consumidores: as novas gerações  estão muito mais informadas e conscientes acerca das responsabilidades dos grandes players do mercado e cobram tais posturas, pois já entendem o que todos deveriam saber: nosso planeta não possui recursos infinitos, assim torna-se inviável o modelo de produção linear sob o qual a vasta maioria da indústria da moda ainda opera, sem falar na poluição e nos excessos de consumo que levam ao desperdício de recursos.

Prada, Everlane, Uniqlo, American Eagle Outfitters são algumas das marcas de moda que vestem grande parte do mundo, mas parecem fazer pouco para combater as mudanças climáticas, segundo o estudo realizado sob a chancela da organização de defesa do meio ambiente Stand.earth. Foi revelado neste relatório que 47 das principais empresas de moda não vão conseguir cumprir a meta de reduzir para a metade as emissões de gases de efeito estufa nas cadeias produtivas até 2030. Este seria o objetivo necessário para combater o aquecimento global e evitar os efeitos devastadores que podem ocorrer num planeta mais quente. 

Até mesmo marcas que se apresentam como amigas do ambiente como Patagonia, Allbirds e Eileen Fisher, não conseguirão cumprir a meta, o que leva o estudo a concluir que não existe moda sustentável, ou, no mínimo, que a sustentabilidade nas cadeias de moda depende muito mais de ações efetivas do que de discursos bonitos ou metas vagas. Ao longo dos últimos anos, ouve-se muito sobre empresas de moda falando em medidas para melhorar a sustentabilidade, mas não há comprovação do que realmente está sendo feito internamente, pois nem tudo é fiscalizado ou auditado. As informações são disponibilizadas pelas próprias marcas, muitas vezes de forma vaga ou com ações incipientes. Pouco se sabe sobre o que o setor da moda está fazendo para eliminar os combustíveis fósseis da cadeia de suprimentos. 

Recentemente as Nações Unidas divulgaram uma análise que sintetiza 14 mil pesquisas e demonstra que os seres humanos causaram tantos danos ao planeta que as temperaturas deverão aumentar 1,5 º C nas próximas duas décadas, a não ser que se reduzam drasticamente as emissões de GEE. Se isto não se verificar, o planeta vai ficar mais quente e ameaçar várias espécies animais e vegetais.

É aqui que entra a indústria da moda, uma vez que os especialistas acreditam que o setor é responsável por 5% a 8% de todas emissões de GEE em nível global, resultantes de instalações produtivas movidas a carvão e da dependência de fibras derivadas de combustíveis fósseis, como o poliéster e a poliamida. 

Perante o cenário devastador, algumas marcas, como a Allbirds e a Lululemon, prometem neutralizar a pegada de carbono nas lojas e nos escritórios e recorrer a fibras de base vegetal em vez de sintéticas. No entanto, o problema persiste porque o grande obstáculo é que 80% das emissões de uma empresa de moda são provenientes das fábricas e 10% da expedição. Não adianta as marcas de moda se comprometerem de forma a produzir efeitos positivos se estão focadas apenas em ações mitigatórias, sem continuidade ou pior:  investindo naquelas que geram um bom marketing, sem de fato resolver o problema, que é falar sobre a produção e o transporte, os quais representam a maior parte das emissões.

"No Man's Land", exposição composta por 30 toneladas de roupas descartadas, no Park Avenue Armory, em Nova York, 2010/ Foto: Divulgação Stan Honda/Agence France- Presse/ Getty images

Transformar a cadeia de suprimentos é uma batalha difícil. A maioria das fábricas e todos os navios marítimos do mundo, queimam combustíveis fósseis, as empresas de moda, que impulsionam grande parte dos setores de manufatura e transporte marítimo enviando roupas para tantos lugares, têm um papel importante a desempenhar na regeneração de todo o sistema. Isso é especialmente verdade se essas grandes empresas se unirem e agirem coletivamente. Parte da razão pela qual a indústria da moda emite tanto é que as marcas fabricam enormes volumes de roupas, que vendem a preços baratos. O setor produz cerca de 80 bilhões de roupas por ano, para apenas 8 bilhões de pessoas no planeta. Nessa lógica, a conta realmente não vai fechar, não tem como sustentar esse sistema, parece óbvio que precisamos mudar a forma como produzimos e consumimos. E que cada leitor ou leitora tire suas próprias conclusões!

Fontes consultadas: 
por Madeleine Muller

Madeleine Muller é produtora, professora no curso de Design de Moda da ESPM, stylist e mãe da Alexia e do André. Pesquisa o consumo consciente da moda e é autora do livro Admirável Moda Sustentável. Escreve quinzenalmente para o Bella Mais. Acompanhe seu dia a dia pelo Insta: @Madi_muller


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