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Madeleine Muller

O amor nos tempos do Coronavírus

Nossa colunista Madeleine Muller fala dos bastidores - e dos sentimentos - do editorial colaborativo do Dia dos Namorados do Bella Mais

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O amor nos tempos do coronavírus pode ser o maior clichê no Dia dos Namorados, e provavelmente a analogia com o título do romance de Gabriel Garcia Marquez já foi usada por muitos, desde o começo do período de confinamento e pandemia, alterando cólera para corona, somos tão criativos! Às vezes o clichê se torna aceitável e até necessário, já que todos sentimos os impactos do isolamento em nossas vidas e relacionamentos, onde, de uma forma ou de outra, percebemos como esse inimigo invisível também está repaginando nossas sensações e impressões a respeito do amor e as variáveis que o circundam.

Ah, sim, e estamos assumindo que qualquer maneira de amor vale a pena, para nos mantermos nos clichês- why not? - como em “Paula e Bebeto”, canção de Milton Nascimento e Caetano Veloso. Com a diferença de que a nossa Paula, a modelo do nosso editorial, tem como parceiro um Cesar, e não um Bebeto, mas o amor deles também vale uma canção.

Paula Visoná e Cesar Kieling são os modelos do editorial para o Dia dos Namorados, produzido para o Bella Mais de forma caseira e com os cuidados necessários para o momento pandêmico, evitando qualquer tipo de aglomeração. O casal faz parte do núcleo que fundou o Somos.Mag, movimento de amor pela moda autoral gaúcha, que traz algumas de suas marcas e criações nas imagens captadas no apartamento deles, com uma simples câmera, um tripé e duas “assistentes”, no caso eu e a Bia Job, testemunhas de um dia na vida deles em tempos de coronavírus.

Muitos casais não tiveram a sorte de Paula e Cesar: confinados em casa, juntos e felizes. Há os que tiveram sua dinâmica brutalmente alterada pelo isolamento. Alguns casais que moram à distância um do outro, cumprem quarentena em bairros distantes ou cidades diferentes e devido a diversas circunstâncias (familiares idosos, grupo de risco, questões operacionais) já estão há dois meses ou mais sem se ver presencialmente. Menos mal que existe internet, chamadas de vídeo, e o santo Zoom!

Curiosamente, existe o oposto, casais que estão juntos (mas separados) em confinamento forçado, tendo de viver 24h um com outro. Não parece nada de mais, à primeira vista. Mas entendendo que boa parte deles pouco se vê durante o dia (trabalhos, reuniões, compromissos sociais, cuidar ou deixar filhos etc.) a convivência forçada e diuturna (em muitos casos, inédita) pode estar também afetando as relações.

E quanto ao amor, palavra que inicia o título deste texto - mote do romance de Marquez - a pergunta que não cala é como sairemos deste período de pandemia e de isolamento? O questionamento que abrange o amor, envolve também relações interpessoais. Sairemos melhores disto tudo, mais capazes de amar (ou perceber) o próximo, mais conscientes e menos egoístas, mais capazes de cooperar uns com os outros, sendo menos individualistas ou ensimesmados em nossos medos e neuras a partir de agora?

Será que nos transformaremos naqueles filmes de ficção científica dos anos 1970 na qual as pessoas “do futuro” (ou seja, hoje) mal se tocam e se falam, numa espécie de assepsia emocional já exposta por Aldous Huxley e Ray Bradbury, com suas surpreendentes previsões em “Admirável Mundo novo” e “Fahrenheit 451”, respectivamente. O amor entre Florentino Ariza e Fermina Daza, os inesquecíveis personagens de Marquez, sobreviveu a décadas de separação, casamentos, revoluções. Outros tempos, outros vírus e formatos repaginados: o amor agora é líquido, e se o Bauman falou, tá falado. Ou escrito. Ou cantado. Nestes tempos – sólidos que desmancham no ar – o amor será mais consciente e resiliente. Paula e Cesar se amam e resistem num tempo caótico onde “qualquer maneira de amor vale a pena, qualquer maneira de amor valerá”. Com o perdão dos clichês.

 

Paula e Bebeto (eu prefiro Paula e Cesar!)

Ê vida, vida, que amor brincadeira, à vera
Eles se amaram de qualquer maneira, à vera

Qualquer maneira de amor vale à pena
Qualquer maneira de amor vale amar

Pena, que pena, que coisa bonita, diga
Qual a palavra que nunca foi dita, diga
Qualquer maneira de amor vale aquela / amar / à pena /
valerá

Eles partiram por outros assuntos, muitos
Mas no meu canto estarão sempre juntos, muito

Qualquer maneira que eu cante este canto
Qualquer maneira me vale cantar

Eles se amam de qualquer maneira, à vera
Eles se amam é pra vida inteira, à vera

Qualquer maneira de amor vale o canto
Qualquer maneira me vale cantar
Qualquer maneira de amor vale aquela
Qualquer maneira de amor valerá

Pena, que pena, que coisa bonita, diga
Qual a palavra que nunca foi dita, diga
Qualquer maneira de amor vale o canto / me vale
cantar

Composição: Milton Nascimento / Caetano Veloso

por Madeleine Muller

Madeleine Muller é produtora, professora no curso de Design de Moda da ESPM, stylist e mãe da Alexia e do André. Pesquisa o consumo consciente da moda e é autora do livro Admirável Moda Sustentável. Escreve quinzenalmente para o Bella Mais. Acompanhe seu dia a dia pelo Insta: @Madi_muller


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