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Por que os jovens brasileiros se casam mais cedo?

Boa parte da nova geração busca relacionamentos excessivamente romantizados e precoces

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Uma pesquisa realizada pelo grupo TheKnot Worldwide, mostrou que os jovens brasileiros se casam mais cedo em relação aos de outros países. Segundo o estudo, dos entrevistados, 56% tinham menos de 26 anos, enquanto a média dos casais de países europeus com a mesma idade foi de 15%.

A pesquisa mostrou também que os casais da geração Z são mais românticos: 91% acreditam em amor para a vida toda. Outro dado trazido é que 59% dos casais da geração Z, nascidos a partir de 1997, declararam ter conhecido seus parceiros antes dos 19 anos, enquanto o percentual de casais millennials, nascidos a partir de 1980, ficou em 15%.

A psicóloga e terapeuta familiar e de casal, Fernanda Vaz Hartmann, explica que a geração atual, assim como a anterior, por um processo histórico, tende a querer “corrigir erros” do grupo antecedente. Então, acaba sendo uma geração muito mais idealista, desde o cuidado com a natureza até a aceitação da subjetividade humana.

“Tudo que ficou ‘capenga’ nas gerações anteriores eles tentam reparar - inclusive as relações familiares e até as românticas" considera. “A geração anterior normalizou o divórcio, e isso talvez tenha banalizado o casamento devido ao pensamento de que ‘se esse não deu certo, caso com outro’”, complementa.

A psicóloga acredita que a geração Z pode se dar conta disso e tentar seguir o caminho extremo oposto. Entretanto, alerta que isso talvez possa não ser saudável. "A ideia do amor romântico, por ser utópico, tende a gerar mais dificuldade de adaptação com a realidade. Quando o casal se junta tendo essa idealização, isso pode causar um estresse entre eles e pode até dificultar o encaminhamento da relação de uma forma duradoura”, defende Fernanda.

Principais riscos das relações precoces

Fernanda ainda chama atenção para os “perigos” que essas relações prematuras podem trazer para o casal. Ela observa que esses relacionamentos precoces em alguns casos acabam se tornando tóxicos, onde um tenta dominar o outro, envolve muito ciúmes, controle e dependência. “Dentre os principais motivos das relações se tornarem assim estão a imaturidade e a insegurança enquanto indivíduo. Isso acaba trazendo exigências inalcançáveis que terminam em padrões de relacionamentos abusivos”, relata. “Eu acredito que as coisas têm que ser vividas ao seu tempo. Um casamento entre pessoas muito jovens tende a ser um complicador, porque as pessoas precisam estar mais inteiras, mais maduras emocionalmente, para poder dar conta dessa exigência que vai ser a construção de um casamento saudável”, defende a terapeuta. 

De acordo com a profissional, a adolescência é um período de descobrimento das pessoas e entrar em relações tão profundas nesse momento pode ser um tanto quanto equivocado. Por ser um momento exploratório da identidade em todos os seus aspectos, pular essa etapa pode ser um complicador.

Porém, a fragilidade das relações familiares, a solidão da era tecnológica, a vontade de sentir que pertencem a um núcleo podem ser fatores que podem contribuir para os jovens quererem entrar numa relação de compromisso, pois isso faz com que se sintam importantes, respeitados e valorizados. “Eu acho que esse cenário atual, que se sustenta muito nas redes sociais, oferece uma privação afetiva importante, que pode conduzir esses jovens a uma precocidade na busca de uma relação conjugal”, opina Fernanda. “É como se fosse quase uma tábua de salvação e isso é muito perigoso” complementa.

Pandemia contribuiu para casamentos prematuros

Para a profissional, a pandemia pode ter influenciado essas relações a uma coabitação, a um casamento prematuro, justamente para que tivesse que fazer uma escolha. “Primeiro pela privação geral, então as pessoas acabaram ficando muito empobrecidas das suas interações sociais e pela própria dificuldade de deslocamento. Então alguns pensaram que já que vamos ter que nos privar de tudo, e agora vai ser um momento muito difícil, quem sabe a gente faz um movimento de um amparar o outro, da gente ficar mais próximo?”, relata. 

Entretanto, Fernanda questiona se a pandemia é uma razão válida para esta tomada de decisão. “Isso seria o medo do afastamento e a ansiedade que essa situação provocou que levou as pessoas a decidirem ficar juntas, enquanto esse processo de decisão de ficar com o outro deveria ser sustentado muito mais na questão do envolvimento afetivo, do desejo de ter um projeto em comum, do que de fato de uma situação que gera medo e que gera receio de privação de contato”, explica.

Para a psicóloga, o fato de os jovens não terem vivenciado o que era pertinente na etapa do desenvolvimento, ou seja, não ter se permitido vivenciar outras relações e experiências, pode fazer com que a pessoa “se desperte” para isso posteriormente, e aí ela pode então querer ter essas vivências. “Chega um momento em que a relação não tem mais aquele apaixonamento, aquela coisa mais adrenérgica. E, por ser jovem, a pessoa pode achar que não gosta mais, fazer uma leitura equivocada das suas emoções e aí penso que ela pode querer romper com essa relação, por achar que em outras ela pode ter a mesma adrenalina, a mesma coisa do momento de paixão”, finaliza.

por Mariana Nunes

Mariana Nunes é jornalista. Ama café, praia, chocolate e futebol - não necessariamente nessa ordem. É torcedora fervorosa do Internacional e repórter do Bella Mais. @a_marinunes


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