capa

Fadiga pandêmica: como lidar com ela?

Termo da OMS define o cansaço derivado do esgotamento gerado pela hipervigilância e pelo medo do vírus

publicidade

"Estou exausta, não aguento mais!".

No último ano, frases como essa foram recorrentes e, junto com ela, um dos aspectos que passaram a ganhar nossa atenção foi a saúde mental. Diante de um cenário de incertezas, os “problemas habituais” acabam ganhando uma maior proporção, fazendo com que haja a “fadiga pandêmica”, termo usado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para definir o cansaço derivado do esgotamento gerado pela hipervigilância e pelo medo do vírus.

Conforme explica a psicóloga e diretora da Máxima Performance, Simone Grohs, o estado crônico de hipervigilância prepara o nosso organismo para lutar, fugir ou paralisar, desencadeando os sintomas reconhecidos como estresse, por exemplo: ansiedade, apatia, frustração, irritabilidade, cansaço ou falta de motivação, distúrbios do sono, fadiga, dores de cabeça tensionais, problemas gastrointestinais ou sensações físicas relacionadas à ansiedade (falta de ar, taquicardia, sudorese). “Todos são sintomas decorrentes do estresse crônico, quando o corpo está continuamente desencadeando reações de luta e fuga por sentir-se ameaçado”, relata.

Outros problemas, como a dificuldade de tomar decisões simples, problemas de memória e atenção também têm sido relatados. Isso também ocorre porque o nosso organismo percebe uma ameaça, mas por ser “invisível”, não sabe de que maneira precisa se preparar com as estratégias antigas de sobrevivência. “O esforço cognitivo para prestar atenção no ‘inimigo invisível’, aprender estratégias e agir são  muito maiores do que quando tínhamos os desafios conhecidos: trânsito, situações no trabalho, perda de emprego, entre outros”, aponta Simone.

Uma alternativa encontrada por algumas pessoas é o afastamento das notícias relacionadas à Covid-19, como forma de dar um “descanso para a mente”. Simone explica que isso pode ajudar, mas é preciso compreender que as causas da fadiga pandêmica são multifatoriais. “Vários estudos realizados na pandemia demonstraram que os veículos de comunicação cumprem um papel importante na disseminação de informação às populações, mas também, talvez pelo desconhecimento do problema, acabaram sendo responsáveis pela exacerbação de alguns medos, contribuindo para o aumento dos níveis de ansiedade. Atualmente, ainda que não tenhamos muito conhecimento sobre vários aspectos da doença, já podemos selecionar as notícias e a frequência na qual buscaremos informações. É preciso ter informação na medida em que não aumente a ansiedade”, alerta. 

Atenção à saúde mental reforçada

A pandemia trouxe à tona a emergência de rever o conceito de saúde mental e suas implicações na qualidade de vida pessoal e coletiva. “Saúde mental é ter a capacidade de cuidar de si e de pedir ajuda, saber requisitar os recursos adequados quando necessário”, explica a psicóloga. 

Pessoas que não tinham o hábito de cuidar de si, especialmente das suas emoções, descobriram de uma forma dolorida a importância desse cuidado. Isso é compreensível, porque o preconceito com o sofrimento psíquico é antigo e persiste até hoje. “A maioria das pessoas desconhece suas reações às adversidades, apenas reage aos problemas do cotidiano, sem autoconsciência quanto às suas emoções, às repercussões no corpo, no sono, na alimentação e nos relacionamentos. Essa pode ser uma das causas para os índices alarmantes de ansiedade, depressão e até violência doméstica, desde o início da pandemia”, aponta.

Alternativas para enfrentar

Apesar das dificuldades, essa crise é também uma oportunidade de rever valores, aprender novas maneiras de viver. Conforme destaca Simone, a capacidade humana de (re)aprender durante a vida depende da neuroplasticidade (adaptabilidade neuronal) e refere-se à propriedade do sistema nervoso de mudar, adaptar-se e moldar-se ao longo do desenvolvimento e na exposição a novas experiências. Podemos escolher aprender com essa experiência utilizando algumas estratégias:

Aceitar: É preciso reconhecer e aceitar que é normal procrastinar, ter algum desânimo, ficar triste, ter irritabilidade. Criticar-se por não se sentir bem ou exigir ter mais produtividade pode aumentar a sensação de desamparo. Pesquisas demonstram que a postura de aceitação e autocompaixão são fundamentais para aumentar a resiliência (capacidade de enfrentar desafios e transformar-se de maneira positiva).

Estabelecer uma rotina: Depois de um ano de confinamento, já é possível ter uma rotina estabelecida. O cérebro se adapta melhor a padrões de comportamento, à regularidade de horários. A rotina mais organizada, sem rigidez, pode aumentar a sensação de segurança.

Estabelecer pausas reparadoras: A atenção focada durante períodos longos leva ao esgotamento, por isso é importante fazer pausas adequadas. Pode ser assistir a um filme, fazer um alongamento, curtir a família. Porém, quando paramos para curtir esses momentos, nossa mente divaga e pode ser tomada pelas ruminações mentais – tarefas, contas, prazos, medo de perder o emprego. Quando isso acontece, nossas pausas não são restauradoras e o desgaste persiste. Jogar com seus filhos, fotografar, desenhar, dançar, ler um livro, são exemplos de pausas reparadoras. 

Escolher seu passatempo longe das telas: É importante não se cobrar por resultados, não estamos em uma maratona de artes ou produtividade.

Fazer a respiração diafragmática: Pesquisas apontam que a respiração diafragmática aumenta o índice da variabilidade da frequência cardíaca das pessoas, associado à autorregulação emocional e melhora da atenção, da capacidade de tomada de decisão, planejamento e execução.  

Resgatar os aspectos positivos das conexões: O ser humano é capaz de direcionar sua atenção e o autocontrole para ressignificar suas experiências. Resgatar o sentido de cuidado nas relações de trabalho e na família pode aumentar a sensação de conforto psicológico.

Praticar a solidariedade: Engajar-se em campanhas solidárias têm influência sobre o nosso sistema de processamento emocional (que rastreiam os perigos à volta). Quando praticamos atos solidários, essas estruturas são desativadas – paramos de perceber ameaças em qualquer estímulo ambiental, aumentando a sensação de confiança e de conexão com as pessoas.

Exercitar a gratidão: A gratidão libera dopamina, neurotransmissor que funciona como estimulante, tendo papel fundamental na motivação. Além disso, pesquisas indicam que as pessoas gratas têm mais interesse em cuidar de sua saúde, têm mais resiliência: têm níveis de energia mais altos, são mais relaxadas e mais felizes. A gratidão direciona a nossa atenção para o que temos, nos ajuda a valorizar o que conquistamos e a aceitar as coisas como são. Essa postura favorece a diminuição da ansiedade, aumentando as sensações positivas.

por Mariana Nunes

Mariana Nunes é jornalista. Ama café, praia, chocolate e futebol - não necessariamente nessa ordem. É torcedora fervorosa do Internacional e repórter do Bella Mais. @a_marinunes


compartilhe