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Alcoolismo feminino preocupa durante o isolamento social

O álcool pode ser usado (de forma equivocada) para diminuir a ansiedade ou trazer a sensação de prazer

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Um estudo realizado pelo Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa) revela que houve um aumento de 19,5% nas internações de mulheres por causas relacionadas ao álcool entre 2010 e 2018, passando de 85.311 para 101.902 casos. O levantamento, que faz parte da publicação publicação Álcool e a Saúde dos Brasileiros – Panorama 2020, mostra ainda que o número de mortes de mulheres pelo mesmo motivo também cresceu: de 13.813 óbitos no país em 2010 para 15.876 em 2017, o que representa um aumento de 15%.

Outro fator que preocupa é o isolamento social, que é um agravante para o aumento do consumo de bebidas alcoólicas em todos os públicos - e também para as mulheres. Segundo Márcia Surdo Pereira, médica do Serviço de Psiquiatria  do Hospital Moinhos de Vento, isto pode vir a se tornar um grande problema principalmente naquelas pessoas que já apresentavam algum tipo de fragilidade emocional prévia. “Neste momento pode existir algum tipo de liberacionismo interno e aumento da permissividade para consumir álcool. É a hora em que muitas mulheres saíram da rotina e pararam com outras atividades que lhes davam prazer externamente ou então podem estar tendendo a enfrentar situações domésticas negativas de uma forma menos saudável ou com menos alternativas”, explica. 

Ainda de acordo com a médica, este aumento do consumo de bebida alcoólica também pode ser resultado da associação de outros fatores. “Tanto pode ser um recurso que algumas pessoas usam  para lidar com a ansiedade trazida pelo tempo livre durante a pandemia, ou como uma falsa ideia de uso para relaxar. Também pode ser algo realizado a partir do incentivo de familiares ou figuras públicas bem como a oferta da indústria do álcool que tem feito promoções”, aponta Márcia.

Além disso, o organismo das mulheres é diferente dos homens - o que nos torna mais vulneráveis ao álcool. “Temos mais gordura e menos enzimas metabolizadoras do álcool. Nós, mulheres, sentimos o efeito da substância mais rapidamente, levamos mais tempo para desintoxicar e nos tornamos dependentes com menor tempo de consumo”, alerta a psiquiatra.

Alcoolismo feminino x masculino

Quando se trata de alcoolismo, existem algumas diferenças na doença entre homens e mulheres. Uma delas é a idade de início do consumo. “As mulheres tendem a consumir álcool mais tardiamente ou então buscar ajuda mais tarde. Muitas vezes isto tem relação com tabu ou preconceito na forma de como a sociedade lida com o alcoolismo feminino”, explica Márcia. Outro elemento a ser observado é a motivação ao consumo. “Para as mulheres, estudos apontam que o início do consumo muitas vezes se dá no momento de saída dos filhos de casa - ninho vazio. Outros fatores de risco para consumo problemático de álcool por mulheres, podem ser parceiro que bebe pesadamente, depressão ou abuso sexual”, aponta a médica. Márcia também destaca que nas últimas décadas a mulher tem saído mais de casa para o exercício profissional e isto também pode ter levado a um maior consumo - a competição entre os gêneros e os happy-hours. 

Com relação ao tratamento, também encontramos diferenças. Apesar de ser uma doença crônica e sistêmica, igual a dos homens, o papel da sociedade quando tem que se lidar com tabu e preconceito influencia e pode retardar a busca por ajuda e tratamento. “Em alguns locais, (AA, unidades de internação, grupos de apoio), onde se obteve a experiência de tratamentos para somente mulheres, houve algum percentual de maior abertura ao diálogo, elas puderam falar mais abertamente e sem a vergonha quando provocada pelo ambiente e medo do julgamento e isto facilita a busca de auxílio”, explica Márcia.

Preconceito acompanha as mulheres

O preconceito com mulheres nessa situação dificulta a busca de ajuda direta relacionada ao consumo de álcool. Muitas vezes, elas acabam indo às emergências ou a seus médicos levadas por outras razões indiretamente relacionadas ao consumo. É comum complicações médicas do tipo hipertensão, cirrose, traumas domésticos, entre outros. 

“A sociedade  é dura no julgamento de mulheres com problemas com bebidas e muitas vezes tendem a vê-las de uma maneira negativa, ou seja, personalidades desviantes, intratáveis, que abandonam seu papel de mãe, com tendência à promiscuidade”, ressalta Márcia. Porém, segundo a médica, um problema mais contemporâneo que tem chamado a atenção é o fato de que as meninas, diferente das mulheres mais velhas, têm consumido bebida alcoólica cada vez mais cedo. O que as expõem a inúmeros riscos desde violência sexual e gravidez indesejada, por exemplo. “Então, parece que nesta faixa etária o estigma está desaparecendo e aí podemos pensar em outros aspectos, que tem a ver com o papel da família e o cuidado com o seus adolescentes”, alerta a psiquiatra. 

Se você está enfrentando problemas com bebida alcoólica pode procurar o Alcoólicos Anônimos. Durante a pandemia de Covid-19, as reuniões online tem sido uma opção oferecida pelo órgão. Busque ajuda!



 


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