capa
Bem - Estar

Dois anos de pandemia: as consequências e lições trazidas pelo período

Aos poucos, a vida volta ao normal, mas o período pandêmico deixa para trás um legado de consequências emocionais e aprendizados

publicidade

No dia 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu a existência de casos de Covid-19 em vários países e regiões do mundo, decretando o início da pandemia do novo Coronavírus. Ao longo dos dias seguintes, países como o Brasil, começaram a implementar as primeiras medidas de distanciamento social. 

Agora, passados dois anos desde o acontecimento, a vida tem voltado à normalidade. Na semana passada, por exemplo, a Prefeitura de Porto Alegre decidiu desobrigar o uso de máscaras ao ar livre. A sensação é de que a pandemia, aos poucos, vai sendo deixada para trás. No entanto, esse período de restrições impactou a todos e trouxe diversas consequências, principalmente emocionais.

Saúde mental em alerta

O aumento da preocupação e cuidado com o bem-estar emocional é um desses efeitos da pandemia. Segundo a psicóloga e coordenadora do Comitê de Psicologia Sistêmica da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul (SPRGS), Larissa Machado Montardo, as pessoas passaram a viver de outra forma. “E a atenção voltada para a saúde mental foi fundamental para enfrentar a pandemia e adaptar-se a esses novos comportamentos", ressalta.

A psicóloga Patrícia Mello complementa ao explicar que antes da Covid-19, os indivíduos viviam no “piloto automático”, em rotinas acomodadas, algo que mudou completamente nos últimos dois anos. “As pessoas começaram a fazer reflexões que não costumavam e, não somente observaram mais os efeitos dessa problemática na saúde mental, como também foram mais alertadas sobre isso (pelos conhecidos, pela mídia, etc). Tudo contribuiu para que se prestasse mais atenção na saúde mental e, por conseguinte, se preocupasse mais em cuidar dela”, comenta.

Consequências emocionais

Mas o período não serviu apenas para reforçar cuidados. A pandemia deixou também consequências emocionais que ainda vão permanecer por um tempo, mesmo com a volta à rotina anterior. Larissa observa que os principais efeitos têm relação com a convivência social e o período em que ficamos isolados. “Ouço pacientes que não sabem mais se relacionar em grupo, que preferem interações com uma ou duas pessoas, relatam sentir medo de se tornarem antissociais, no sentido de viverem isolados dos outros”, lembra a coordenadora da SPRGS.

Outros sentimentos como a tristeza e a insegurança, além da ansiedade, tornaram-se comuns, principalmente na vida daqueles que perderam familiares ou amigos e estão passando por um processo de superação do luto. “Escuto alguns pacientes falando sobre a dificuldade de entender que a pessoa não está mais no convívio, já que não conseguiu se despedir de forma adequada, em função das condições limitadas do velório”, relata Larissa. 

Por gerar esse tipo de consequência, a pandemia pode ser classificada como um “evento estressor potencialmente traumático”. “Estressor porque promove uma série de alterações cognitivas, emocionais, comportamentais e fisiológicas e todas essas mudanças exigem que o organismo gaste mais energia para viver. Utilizamos ‘potencialmente traumático’ porque nem todo mundo vai ter prejuízos importantes ao longo da vida”, explica a psicóloga Patrícia. 

Ou seja, os efeitos da pandemia a longo prazo variam conforme cada pessoa e dependem de fatores que predispõem ou protegem ela dos impactos trazidos pelo período. Entre esses fatores estão desde vulnerabilidades socioeconômicas, experiências traumáticas até questões de gênero. De acordo com Patrícia, as mulheres têm mais chances de ter prejuízos emocionais do que os homens, por exemplo.

Efeitos sobre as mulheres

Múltiplas jornadas e até mesmo violência doméstica são apenas alguns dos problemas e desafios que eram enfrentados pelas mulheres antes mesmo da pandemia, mas que se ampliaram no período. Larissa alerta para o fato de que a desigualdade social e o desemprego colocaram mais mulheres em situação de risco. Porém, para aquelas que continuaram trabalhando, também não foi um momento fácil.

“As mulheres que conseguiram manter seus empregos e passaram para home office, tiveram uma sobrecarga, por precisar cuidar da casa, do trabalho e dos filhos. A jornada estendida de home office, e a romantização do trabalho em excesso, faz com que a exaustão seja ainda mais intensa e prejudique a saúde mental das mulheres”, afirma a coordenadora do SPRGS.

O efeito desse acúmulo de papéis é uma estafa - ou esgotamento - emocional, um processo psicofisiológico que ocorre quando pessoas passam por longos períodos de estresse sem pausa, conforme esclarece Patrícia Mello. Os sintomas incluem cansaço extremo, fadiga, dores no corpo, alterações de sono e apetite (para mais ou para menos), ansiedade, tristeza e desesperança. Por isso, é preciso ficar atenta a possíveis sinais de exaustão.

Lições aprendidas e a volta à normalidade

Além dos efeitos emocionais trazidos pela pandemia, o período de restrições e distanciamento possibilitou que cada um tivesse um tempo para refletir, não só sobre o presente, mas principalmente sobre o futuro e, a partir, desses pensamentos, tirar algumas lições que o Bella Mais pediu para as psicólogas Larissa e Patrícia listarem. Veja abaixo:

Valorização da proximidade, do contato físico, de estar com o “outro”, algo que se tornou um desejo e uma necessidade;

A importância da atenção e do cuidado com a saúde mental;

Ampliação e fortalecimento da rede de apoio, com esforços para manter vínculos seguros e relações saudáveis e equilibradas;

Necessidade de separar um tempo para si mesmo e para se dedicar a atividades que gosta, permitindo maior contato com emoções positivas;

Valorização da casa, do ambiente físico que representa nosso “mundo interno”;

Desenvolvimento do autoconhecimento e compreensão da importância de curtir a própria companhia.

Lições aprendidas e pandemia indo embora, é hora de retomar a rotina, mas é claro, sem deixar de lembrar tudo que passamos. Especialistas até mesmo dizem que não será mais possível voltar à normalidade. “Um evento dessa proporção sempre causa mudanças. A vida se divide em ‘antes e depois’ da pandemia”, reforça Patrícia. 

Para Larissa, o momento que estamos vivendo é uma oportunidade de modificar hábitos e estabelecer novas conexões. “Acredito que cada pessoa vai lidar de uma forma com esse retorno à ‘normalidade’, ou seja, um novo reencontro”, finalizou.

por Vitória Nunes Soares

Como boa repórter, está sempre pronta para aprender sobre todas as coisas. Tem estilo low profile, ou seja, é meio sumida das redes sociais pois prefere viver.


compartilhe