capa

Camila Farani: “Se não abrem espaço para nós, precisamos ter a coragem de ocupá-lo mesmo assim”

Em entrevista exclusiva ao Bella Mais, a empresária Camila Farani falou sobre os desafios do empreendedorismo feminino

publicidade

O empreendedorismo é uma das respostas para a transformar a vida das pessoas, das empresas e da sociedade. É nisso que acredita Camila Farani, empresária, empreendedora, educadora e investidora.

Em seu livro mais recente, “Desistir não é opção”, ela aborda assuntos que vão desde a cultura da informalidade brasileira, à falta de especialização e necessidade de aprendizado contínuo dos empreendedores sobre gestão, além de destacar a necessidade do empreendedor reconhecer e vencer o medo de dar o próximo passo.

Em entrevista exclusiva ao Bella Mais, ela conta sobre a sua trajetória e os principais desafios do empreendedorismo, principalmente para as mulheres. Confira:

Bella Mais - Como foi a sua transição de executiva para investidora? 

Foi um processo natural, resultado da minha inquietude. Comecei trabalhando no negócio da minha família, a Tabaco Café, até que em determinado momento propus à minha mãe que, se eu conseguisse aumentar as vendas em 30% em um mês, receberia uma pequena participação da empresa. Apesar de não ter atingido a 100% a meta, cheguei ao marco de 28% com a ideia de incluir o Iced Coffee no cardápio da nossa cafeteria, ganhei a sociedade. Isso tudo foi me fascinando. Aos 21 anos comecei a empreender. Conheci o mundo do investimento anjo por intermédio de um amigo investidor, e me apaixonei. Dei este passo no momento em que me senti segura o suficiente para me aventurar nas incertezas do ecossistema de inovação. O importante é ter consciência dos riscos, mas saber também que os resultados podem ser muito gratificantes. 

Bella Mais - Você já atuou na área da alimentação e hoje é uma referência na área de investimentos em tecnologia. Sente que enfrentou desafios em algumas dessas áreas por ser mulher? 

Há muitos desafios e incertezas neste caminho, sim. Quando decidi ser investidora, não via muitas mulheres nesta área. Mesmo hoje, não passamos de 12% do total, mas ter atitude me ajudou a seguir em frente. Se não abrem espaço para a gente, precisamos ter a coragem de ocupá-lo mesmo assim. É assim que mostramos que somos capazes para todo o mercado e motivamos outras mulheres a seguirem o mesmo caminho. 

Bella Mais - Qual a importância de projetos como o Ela Vence?

Apesar de a representatividade feminina no empreendedorismo vir evoluindo significativamente – segundo o Sebrae, somos 24 milhões no país –, as mulheres ainda enfrentam muitas dores ao optar por serem donas do próprio negócio. Entre os desafios, estão a falta de referências, de redes de apoio e de capacitação. Então, para evitar que mais mulheres passem pelo que passei, criei a comunidade Ela Vence. Nosso objetivo é criar as condições necessárias para termos mais mulheres empreendedoras e investidoras. Com conteúdo e ações voltadas ao desenvolvimento de lideranças femininas, buscamos apoiar as empreendedoras e nos unir a outras iniciativas para, juntas, ganharmos força a partir das conexões criadas, e impactarmos mais mulheres. 

Recentemente, o estudo inédito “Mulheres e o Ecossistema Empreendedor”, realizado pela Liga Ventures, em parceria com o Ela Vence e a PWN São Paulo, mapeou o perfil e os desafios das donas de empresas no Brasil. A partir do cruzamento das respostas dessa heterogênea amostragem, o grupo  composto por 1.180 donas de empresas, distribuídas pelas 27 unidades federativas do país, observou-se múltiplas disparidades de oportunidades para empreender. As barreiras são geradas a partir de uma complexa equação que leva em conta variantes como origem socioeconômica, questões étnico-raciais, orientação sexual, deficiência, maternidade, local de atuação, nível de escolaridade, idade, entre outros fatores. 

Bella Mais - Recentemente, você ganhou o prêmio Women in Tech. Como se sente sendo uma referência feminina no mundo dos negócios? Acredita que sua história pode inspirar outras mulheres?

Além de ser um grande orgulho receber estas distinções, acredito que isso inspira outras mulheres. Sou uma investidora muito ligada ao mundo da tecnologia, e estou sempre muito atenta as novas possibilidades que o mundo digital traz para os negócios. No momento, um grande ponto de interesse meu, por exemplo, são temas como metaverso, NFT ( já tenho minha própria NFT em parceria com a Play9), DeFi, Web3. Então, isso torna essa distinção que recebi da WIT ainda mais especial. 

Olhando para a minha trajetória, decidi  seguir este caminho porque percebi que faltava um olhar empático para mulheres empreendedoras, para  elas também terem mais oportunidades de receber investimento e verem seus negócios crescer. Já encontrei empreendedoras que nem cogitam tirar a ideia do papel simplesmente por medo de fracassar. É nesse sentido que trabalho para aumentar a autoestima destas mulheres e não deixar que elas percam oportunidades ou que desistam no primeiro obstáculo.  Os desafios que enfrentei me ensinaram o que preciso para ajudar outras pessoas a deixarem o medo de lado e se jogarem nesse mar de oportunidades que é o empreendedorismo. 

Bella Mais - Quais foram as principais lições que a pandemia trouxe para o mundo dos negócios e quais são os principais desafios que os empreendedores precisam enfrentar atualmente?

As restrições de combate à Covid-19 impulsionaram um novo olhar sobre a transformação digital e todo ecossistema empreendedor foi desafiado. Neste período, a digitalização foi acelerada e o mercado compreendeu que este é um caminho sem volta. Mas, para o empreendedor tornar um negócio estritamente físico em uma operação figital ( físico + digital), há uma série de desafios. O digital é um novo mundo, que exige novas estratégias a serem implementadas de forma rápida e precisa. Por isso, acredito que um dos grandes desafios aqui é se adaptar à velocidade de um mercado que se alimenta da inovação constante. A mais importante missão, agora, é entender o comportamento do cliente pós-pandemia.

Apesar de toda sobrecarga gerada pelo alastramento do vírus, o levantamento  “Mulheres e o Ecossistema Empreendedor”, mostrou que 53% das entrevistadas disseram ter iniciado o negócio ao visualizar uma oportunidade e 37% afirmaram ser este um dos seus desejos profissionais. A menor parte, 15% das respondentes, afirmou abrir a sua empresa para complementar a renda, 11% porque se tornaram mãe e queriam priorizar a família e 7% após serem demitidas do emprego

Bella Mais - Como surgiu a ideia de escrever o livro “Desistir não opção”? Como a publicação pode ajudar futuros empreendedores, principalmente a lidarem com o fracasso?

Perdi meu pai quando eu tinha 4 anos, e vi minha mãe batalhar muito ao longo da vida para conseguir sustentar a família. Foi por necessidade que ela decidiu abrir um negócio — o Tabaco Café, que virou nosso ganha-pão. Eu comecei a trabalhar no atendimento aos 16 anos e, com o tempo, passei a ajudar na gestão.

Na época, eu não tinha muitas referências externas. Sempre tendo a minha mãe como inspiração, aprendi com ela a ter persistência. Começamos sem nenhum conhecimento de gestão, fluxo de caixa etc. Hoje, meu lema — que também virou o título do meu livro — é "Desistir não é opção”. Para quem está se jogando nesta empreitada, principalmente àqueles que sentem que não têm outra alternativa, o livro ajuda a identificar oportunidades no mercado e estruturar os seus negócios para torná-los bem sucedidos e longevos. Minha missão é ajudar a formar a nova geração de empreendedores do Brasil.


compartilhe