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130 anos dando voz ao tempo e sentido à história

Por Cezar Miola, conselheiro do TCE-RS e vice-presidente de Relações Político-Institucionais da Atricon

Pelas 3h da tarde, aportava na pequena rodoviária de São João da Urtiga o empoeirado ônibus da empresa Unesul, que saía da Capital bem cedinho, “pingando” por dezenas de cidades até chegar ao destino final, já em solo catarinense. Ansioso eu o aguardava, porque ali também chegava o Correio do Povo e tudo o que ele representava naqueles dias da “aurora da minha vida, da minha infância querida” dos anos 1970.

Há celebrações que pertencem a todos. Os 130 anos do Correio do Povo, comemorados em 1° de outubro de 2025, são um desses marcos: fazem parte da história do Rio Grande do Sul e do Brasil, mas também da minha própria memória. Foi nas páginas do jornal que comecei a decifrar o mundo, ainda menino, dentro da pequena sapataria do meu pai. Entre solas, tacos e marteladas, eu lia as notícias em voz alta, dando vida às manchetes enquanto ele trabalhava e nos encantava com as histórias vividas no “teatro de operações” da Segunda Guerra, onde serviu com patriotismo. No andar de cima do velho casarão de madeira, tocando o pedal da máquina de costura, minha mãe dava forma às tantas peças de roupa que confeccionou em incontáveis dias e noites. Ela, mesmo com a “vista cansada”, encontrava instantes para percorrer algumas daquelas grandes páginas, o que era outro exemplo. E assim, naquele espaço simples, o jornal se tornou escola, companheiro e ponte entre nossa modesta rotina e os grandes acontecimentos do país e do mundo.

O Correio do Povo atravessou gerações como testemunha dos grandes acontecimentos a ponto de surgir uma espécie de sentença: “Se deu no Correio, é verdade”. Desde coberturas de momentos políticos decisivos e episódios inesquecíveis, passando por transformações sociais e econômicas do Estado, até as catástrofes climáticas, o jornal manteve sempre o compromisso com a pluralidade divisada ainda no seu primeiro editorial. A enchente histórica de 2024 inundou Porto Alegre e diversas cidades do Estado, arrastando memórias e casas, destruindo ruas e estradas. A própria sede do jornal e seu parque gráfico foram atingidos pelas águas. Ainda assim, o Correio não deixou de levar notícias à população. Em meio ao caos e à urgência, cada reportagem se tornou um recurso precioso para orientar e salvar vidas, mostrando que a informação é tão vital quanto a solidariedade.

Celebrar essa trajetória é reconhecer que a imprensa segue sendo essencial para a democracia. Em tempos de desinformação e de ataques às instituições, o jornalismo responsável, como o praticado pelo Correio do Povo, é garantia de que a sociedade não perde sua voz nem sua memória. Afinal, são 130 anos dando voz ao tempo e sentido à história.

Do Leitor - 10/10/2025 | 6:00

130 anos