Marcha à ré

Marcha à ré

A Justiça acolheu um parecer do Ministério Público do Trabalho que estabelece vínculo entre os motoristas que utilizam o aplicativo Uber com a empresa

Guilherme Baumhardt

publicidade

Alguns dias atrás, a empresa Cabify – aplicativo de transporte de passageiros – anunciou que deixará o Brasil em junho. Não houve justificativa formal para a decisão, mas especula-se que pandemia e crise econômica tenham motivado o encerramento das operações. Nesta semana, porém, surgiu um fato novo e que poderia muito bem entrar no balaio dos itens que levaram a plataforma a abandonar solo brasileiro.


A Justiça acolheu um parecer do Ministério Público do Trabalho que estabelece vínculo entre os motoristas que utilizam o aplicativo Uber com a empresa. Decisões semelhantes já haviam sido tomadas, mas todas de primeira instância. Neste caso, estamos tratando de uma sentença de um colegiado, de desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas-SP). É mais uma prova de que quando tentamos mirar o futuro, buscamos o retrovisor.
As relações de trabalho já mudaram e mudarão mais, em uma velocidade ainda maior a partir dos próximos anos. Já tratei do tema aqui, na coluna. Há uma clara tendência de que cada vez mais tenhamos “trabalhos”, em substituição a “empregos”. Se por um lado talvez não tenhamos mais a sensação de segurança, de pertencer a algum lugar ou empresa, por outro teremos certamente mais liberdade para definir horários e organizar nossa vida de maneira mais livre e independente.
Não estamos tratando de uma mudança simples. Ela é muito mais profunda do que imaginamos. A pandemia nos mostrou que home office é possível para muita gente que jamais sonhou trabalhar em casa. E se dá para trabalhar em casa, não é preciso necessariamente morar na mesma cidade da empresa para a qual se trabalha – ou se presta um serviço.


O mercado imobiliário já percebeu isso. Apartamentos e casas que possam comportar um escritório, além do tradicional espaço para a família, passaram a ter maior procura. Salas comerciais têm menor busca, ou tiveram mudança de perfil. Uma companhia que usava um andar inteiro de um edifício comercial, agora precisa de uma sala. Quem antes ocupava uma sala, agora utiliza um coworking. Além disso, aqueles que estão cansados dos grandes centros urbanos cogitam desempenhar suas atividades profissionais em outra cidade. No caso do Rio Grande do Sul, muita gente talvez realize o sonho de sair de Porto Alegre e Região Metropolitana para morar na Serra ou no Litoral.
Com esta decisão, o TRT-15 acaba de levantar mais um muro. Aqueles que veem nesse muro uma proteção do emprego, que pode evitar uma demissão, esquecem que o mesmo muro é também um obstáculo para o ingresso no mercado de trabalho. No Brasil funciona assim: ou a gente anda na contramão do mundo, ou engata a marcha ré e acelera com vontade.

40 milhões
O dado é da Universidade de Oxford. O Brasil ultrapassou nesta quarta-feira a marca de 40 milhões de doses de vacinas contra o coronavírus aplicadas na população. O número coloca o país na quinta posição do ranking mundial, atrás da China, Estados Unidos, Índia e Reino Unido. Levando em consideração a população (proporcionalidade), o Brasil cai para a 12ª posição, mas neste caso fica à frente dos seus parceiros do BRICs (grupo que reúne os chamados países em desenvolvimento – Rússia, África do Sul, além dos já mencionados Índia e China).


Além disso, uma espécie de janela de oportunidade se abriu para nós. Temos uma previsão que supera 30 milhões de novas doses para maio, lotes que chegarão aos brasileiros justamente no momento em que verificamos estabilidade ou queda no número de casos e mortes. Se não houver nova cepa ou fato novo similar, temos chances de não viver uma terceira onda. E, se houver, que ela seja menos avassaladora do que foi a segunda. Aguardemos.


Mais Lidas

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895