Um novo centro

Um novo centro

Não é tarefa fácil, especialmente após tanta degradação

Guilherme Baumhardt

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A ideia é ambiciosa: dar ao Centro da Capital do Rio Grande do Sul mais do que uma nova cara, mas uma nova vida. Não é tarefa fácil, especialmente após tanta degradação. Sim, degradação. Um termo forte, mas que é preciso. E que só não é aceito por aqueles que não caminham pela região, ou por gente que não viaja e não conhece outras cidades além do nosso quintal. Ou até conhece, mas as experiências se resumem aos entulhos esquerdistas de Havana ou Caracas. Bem, se comparação for neste sentido, nosso Centro não é tão ruim assim.
 
Durante as gestões petistas, os avanços foram pequenos e pontuais. De grandes obras apenas uma considerável reforma do Mercado Público, com a inauguração da cobertura. Um progresso, sem dúvida. Mas a região virou uma espécie de terra sem lei, a começar pela ocupação das calçadas por vendedores ambulantes. A Praça XV era uma corrida de obstáculos, apesar das ações de fiscais da prefeitura. O problema foi resolvido somente na gestão José Fogaça, com a construção do Centro Popular de Compras (conhecido como Camelódromo), iniciativa capitaneada pelo então secretário de Indústria e Comércio Idenir Cecchim.
 
Nos anos seguintes algumas vias foram abertas, espaços de estacionamento públicos foram criados e as vagas rotativas já existentes ajudaram a oxigenar a circulação local. Mas ainda é pouco. Os calçadões talvez já tenham cumprido a sua missão. Para ter maior atratividade, a região precisa da circulação de carros, o que facilita o acesso ao comércio e pode despertar novamente o interesse de imóveis residenciais, algo fundamental para garantir vida noturna saudável e benéfica. É assim na maioria das grandes cidades do mundo. As exceções ficam por conta de metrópoles dotadas de eficientes linhas de metrô, o que não é e nem será o nosso caso.
 
Aos que veem no carro um inimigo, eu convido o leitor que não frequenta o Centro a observar o perfil dos clientes do Mercado Público nos dias de semana, na comparação com o sábado. Entre segunda e sexta-feira, são na maioria trabalhadores que, ao final do dia, passam no mercado e levam para casa frutas, verduras, um pedaço de carne, um pouco de queijo ou pão. No final de semana, com estacionamento liberado no Largo Glênio Peres, desembarcam no mercadão consumidores de mais alta renda e que levam para casa presuntos importados, vinhos de gabarito e iguarias vendidas nas bancas do local. Expandir isso para outras regiões do Centro é vital. Um cliente não anula o outro. Ambos convivem e serão sempre bem-vindos. O Centro comporta todos.
 
Poucas edificações residenciais na região têm garagem, mas isso hoje não é mais um problema. Com o advento dos aplicativos e a melhoria do serviço de táxi da cidade, é preciso que estes veículos cheguem até a porta do prédio, para que as compras do supermercado ou as malas de uma viagem possam ser descarregadas – algo impossível com os calçadões. Ter ou não ter garagem, especialmente para as novas gerações, virou detalhe. Se tiver, bacana. Se não tiver, a turma se vira com os modais disponíveis.
Como se não bastassem os problemas existentes, a pandemia gerou novos desafios. Muitas lojas fecharam, o que reduziu a circulação de pedestres e consumidores pelo Centro. Com o aquecimento da economia – que em algum momento virá – novos negócios surgirão e é importante aproveitar este fôlego novo para impulsionar a revitalização da área.
 
O ponto mais importante e que vale para toda e qualquer região da cidade, porém, é outro: segurança. Sem ela não há renovação possível. Mesclar moradia e atividades comerciais é um ótimo começo, incentivando o que falta neste momento – novas edificações para apartamentos. O secretário de Planejamento da cidade, Cezar Schirmer (uma espécie de “Prefeito do Centro”) sabe disso.
 
Fica também um alerta: muita resistência virá. É a famosa “turma do contra”. O bom debate é salutar e bem-vindo, na tentativa de encontrar os melhores caminhos. Mas se a crítica ficar restrita a termos como “democracia”, “diversidade”, “aspectos sociais” e outras groselhas, ignore. Não é gente que quer ver um centro renovado. É só a mesma patota empacando mais uma vez. Não se trata de democracia, pois não é uma eleição e já temos uma Câmara de Vereadores para deliberar sobre o assunto. O Centro continuará sendo “diverso”, como sempre foi – é uma característica comum aos grandes conglomerados urbanos, em qualquer canto do mundo. E “aspectos sociais” é a expressão que quer dizer muita coisa, mas na verdade não significa porcaria nenhuma. Só serve para deixar o discurso de canhoto ainda mais empolado.
 


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