Senadores, evitem a tragédia

Senadores, evitem a tragédia

Havia a promessa de manutenção da atual carga tributária, sem aumento de impostos.

Guilherme Baumhardt

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Uma bomba fiscal, com uma absurda explosão de carga tributária e a inevitável expulsão do país daqueles que puderem fugir de uma reforma muito, muito distante da que o país precisa. É o resumo do que está nas mãos dos senadores brasileiros. Passados alguns dias da aprovação do texto na Câmara dos Deputados – algo feito a toque de caixa, com a redação sendo alterada inúmeras vezes e sem que a proposta pudesse ser detalhada ao público –, tudo depende do Senado. Agora, com o tempo que não foi dado para a análise dos deputados (muitos pareciam mais preocupados com os R$ 8 bilhões liberados em emendas nos dias anteriores), o quadro começa a ficar mais claro. Se o objetivo principal era a simplificação do sistema, a proposta aprovada descomplica quase nada. É pouco avanço para muito retrocesso.

Havia a promessa de manutenção da atual carga tributária, sem aumento de impostos. Pelo visto, a mentira contada foi grande. A projeção menos agressiva fala em um IVA (Imposto sobre Valor Agregado) na casa de 24% – o segundo mais elevado do mundo. O professor Marcos Cintra (PhD em economia pela universidade de Harvard e ex-secretário especial da Receita Federal) alerta que o índice pode ser ainda maior e projeta um IVA de absurdos 34%! Só acreditou que a mordida ficaria inalterada quem não prestou atenção aos sinais anteriores, emitidos com a proposta do arcabouço fiscal. Para fechar as contas, só havia uma saída: aumento de carga. Ela veio na reforma.

Os problemas não param aí. O setor de serviços (que é grande empregador de mão de obra) seria, sem exagero, “convidado” a se retirar do país, diante de taxas escorchantes. Um exemplo: empresas de tecnologia não pensarão duas vezes antes de empacotar equipamentos, fazer as malas e partir rumo ao Uruguai, por exemplo. Estaríamos expulsando justamente companhias que são desejadas por governos de países desenvolvidos, por empregarem muita gente e exigirem mão de obra qualificada. Ao mesmo tempo, são empresas que produzem baixo impacto ambiental e, por pagarem bons salários, movimentam fortemente a economia.

O ex-ministro Paulo Guedes, ao falar sobre a reforma tributária, dizia sempre que precisávamos de “mais Brasil, menos Brasília”. Havia uma ideia de descentralização, de redução do poder central e reforço da autonomia de Estados e municípios. A reforma apoiada por Fernando Haddad – o sujeito que colava nas provas de economia – vai justamente no caminho oposto. Talvez agora alguns prefeitos, governadores e, o mais importante, a população em geral, entendam a pancada que os espera.

Quando um sistema tributário é ruim (como o brasileiro), torto e repleto de injustiças, a economia acaba encontrando caminhos, nem sempre dignos de nota e elogios – passam pela inadimplência e, não raras vezes, chegam à sonegação. Não faço aqui apologia, apenas injeto doses de “vida real” a algo que é sabido de todos. Com o avanço da tecnologia, que passa pelo cruzamento de dados e por novas ferramentas de controle, avançamos e muito, mas apenas em um dos lados desta moeda. No outro o cenário ficou inalterado. A fiscalização melhorou, mas o manicômio tributário permaneceu. O resultado? O sistema continuou ruim, mas ele passou a ser uma prisão de segurança máxima, em que a Receita Federal sabe exatamente quem gastou, a hora que gastou e como gastou.

Os senadores agora têm a mais nobre das missões: manter e até aprimorar os poucos avanços que a proposta trouxe, especialmente para o setor industrial, que precisa das mudanças para enfrentar a concorrência externa, sem que para isso outros setores recebam pauladas em troca. E, o mais importante, sem aumentar o tamanho da mordida no bolso do cidadão. O futuro do Brasil passa pelo Senado.

 


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