É a falta de confiança, estúpido!

É a falta de confiança, estúpido!

Durante a semana, um vídeo vazado revelou mais detalhes da realidade industrial brasileira.

Guilherme Baumhardt

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Duas semanas atrás, duas gigantes da indústria automobilística nacional anunciaram redução e até paralisação da produção de veículos. Na General Motors, um dos turnos de trabalho foi cortado em uma das linhas de montagem. Mais de mil funcionários terão contratos suspensos (o chamado layoff), para evitar demissões. Na Volkswagen, as fábricas de Taubaté (SP) e São José dos Pinhais (PR) pararam completamente. E tudo isso em meio aos incentivos (tortos) oferecidos pelo governo federal, para estimular a venda de carros novos.

Durante a semana, um vídeo vazado revelou mais detalhes da realidade industrial brasileira. No trecho, o executivo de uma fabricante de motosserras, roçadeiras e outros implementos similares detalha as ações que estão sendo adotadas, para evitar demissões. “Estamos concedendo férias e não compraremos os dez dias de descanso dos funcionários”, afirma. Logo depois, ele reforça que a indústria ficará parada por quinze dias. O motivo, além dos estoques abarrotados? A recente mudança de governo (e as incertezas trazidas por ele).

Embora os dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) ainda não tenham apontado desemprego (as vagas criadas ainda superam os desligamentos), o cenário brasileiro para o segundo semestre é de turbulência. Economistas conceituados apontam para uma redução da atividade econômica e alguns não descartam o fechamento em massa de postos de trabalho.

Nos Estados Unidos, no início dos anos 1990, George Bush tentava a reeleição para a Casa Branca. Perdeu para um caipira vindo do Arkansas – o democrata Bill Clinton. Uma frase cunhada na época por um assessor de Clinton ficou marcada no mundo político e no marketing eleitoral: “É a economia, estúpido!”. Bush pai acreditava que o sucesso norte-americano na Guerra do Iraque seria suficiente para garantir um novo mandato, mas os norte-americanos estavam mais preocupados com o próprio bolso. Em uma livre adaptação, poderíamos fazer hoje um paralelo: “É a falta de confiança, estúpido!”.

A teoria econômica traz algumas lições que o governo lulopetista faz questão de ignorar, quando, por exemplo, insiste em culpar o Banco Central e Roberto Campos Neto pela alta dos juros. Isso é reflexo de um governo perdulário, que pretende gastar mais do que arrecada, um gerador de inflação. Uma das máximas na economia aponta que a confiança é um dos motores de qualquer país do mundo. Se não há confiança, você pode ter todo o capital disponível para investir ou gastar, mas o passo adiante não é dado. No sentido oposto, quando há previsibilidade e aqueles que comandam um país apontam a nação para o caminho certo, você pode não ter o dinheiro, mas vai atrás do capital, contrai dívidas, na expectativa de que o horizonte promissor se confirme.

O Brasil hoje está exatamente neste ponto. Há uma enorme crise de confiança. Não é para menos. O arcabouço fiscal é um retrocesso diante do teto de gastos. A reforma tributária (tão esperada) vai prejudicar setores essenciais da economia. O Palácio do Planalto volta a acenar com socorro financeiro para vizinhos, historicamente inadimplentes. A Petrobras retirou o bloqueio para que empreiteiras envolvidas nos escândalos da Lava Jato prestassem novamente serviço para a empresa. Odebrecht e outras encontram agora caminho livre. A política de preços dos combustíveis reencontrou o populismo, ignorando as oscilações do mercado. Já assistimos a este filme, conhecemos o final e ele não é nada bom. Sabemos bem que leva tempo para arrumar a casa.

Diante disso, há dois caminhos. Um deles é Lula dar uma guinada e voltar a ser o que foi, em 2003, logo que assumiu o primeiro mandato. O problema é que não há nenhum sinal de que isso vá ocorrer, pelo contrário. O outro é trocar o timoneiro. Sim, estou falando em impeachment. De maneira muito pragmática, deixo aqui a pergunta: se já conhecemos o roteiro e no final do filme quebramos a cara, o melhor a fazer não é evitar a tragédia? Somos um Titanic na rota de colisão com o iceberg, mas diferentemente do episódio histórico, desta vez vimos o imenso bloco de gelo mais cedo, com tempo hábil de realizar a manobra, evitar o impacto e o naufrágio.

Geraldo Alckmin não é “nenhuma Brastemp”, como dizia o comercial de televisão de alguns anos atrás. Mas é mais previsível que Lula, governou São Paulo por quatro mandatos sem sobressaltos e, se quiser, pode recuperar parte da biografia rasgada por ele mesmo, quando aceitou ser vice de Lula. Alguém terá a coragem de levar a ideia adiante? Ou vamos esperar as demissões, fechamento de empresas e a crise se instalar novamente? Se a notícia ruim é que o país errou ao escolher Lula sonhando com um governo moderado, a parte boa é que ainda há tempo de corrigir a rota. É isso ou apostar em uma brusca mudança no comportamento lulista.


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