Navegadora brasileira vive em meio à escuridão e ao mar congelado

Navegadora brasileira vive em meio à escuridão e ao mar congelado

Tamara Klink está completando mais um projeto. Após ser a primeira brasileira a cruzar sozinha o oceano Atlântico, agora tornou-se a primeira a atravessar o Círculo Polar Ártico, entre a França e a Groenlândia

No Ártico, Tamara passará meses sozinha em seu barco em meio ao gelo e à falta de luz solar

Por
Rodrigo Thiel

Você viajaria sozinho por meses dentro de um barco de apenas 10 metros de comprimento pelo oceano Ártico? Você ficaria meses em um local no planeta Terra onde, além do frio do inverno, não terá a companhia da luz do sol? Pode parecer uma história de livro ou de filme de ficção, daqueles que geram preocupação, mas é a aventura de uma navegadora brasileira.

Formada em Arquitetura, Tamara Klink decidiu não construir prédios exuberantes para marcar sua carreira, mas deixar como legado uma história de pioneirismo e emoção. Aos 24 anos, ela foi a primeira brasileira a cruzar sozinha as 4 mil milhas do oceano Atlântico, entre a França e o Brasil. Hoje, com 26 anos, Tamara se tornou a primeira brasileira a cruzar o Círculo Polar Ártico, entre a França e a Groenlândia.

Ela conta que a paixão por navegar veio de berço. As histórias de seu pai, o famoso navegador Amyr Klink, serviram de inspiração para instigar o interesse por desbravar os mares, assim como leituras, filmes e diários que acompanha desde cedo. Apesar de uma recusa inicial em ajudar sua filha, Amyr tem auxiliado Tamara em suas viagens. “Ele me lembra que um projeto não é uma aventura. Quando estou muito confiante, ele me lembra de que ainda tenho muitos perigos pela frente”, ressalta a navegadora.

Entre os maiores desafios de uma viagem solitária a um dos destinos mais insólitos do planeta, Tamara cita que navegar no escuro, em zonas com icebergs, é a maior dificuldade. “É bastante assustador, tenho que buscar reduzir os riscos de colisão reduzindo a velocidade e estando atenta ao contexto, aos instrumentos e à intuição. Também é preciso antecipar problemas, conseguir tomar decisões mesmo exausta, gerir o sono, estar sensível a todos os sinais do barco e da natureza, ter disciplina e responsabilidade”, afirma a brasileira.

O seu único companheiro em toda esta viagem solitária é o pequeno veleiro de pouco mais de 10 metros de comprimento, apelidado de “Sardinha 2”. O barco foi construído em 1992 de forma amadora pelo seu antigo dono e o seu nome é uma homenagem a um peixe que vence grandes distâncias e nunca está sozinho. “O barco está bem preparado.

Tenho comida para 1 ano em conserva, desidratados e em grãos. Consumo meus recursos como água, comida e combustível de forma regrada e consciente. Em navegação, durmo períodos curtos, 20 minutos de cada vez. E, ancorada, acordo algumas vezes durante a noite para garantir que tudo está bem”, completou.

Todos bastidores e a viagem em si podem ser acompanhados nas redes sociais da brasileira e em seu canal no YouTube. “Tive o privilégio de saber que navegar era possível graças à minha família e à literatura de viagem. Acho importante dar às outras e aos outros jovens a possibilidade de saber que o mar e a navegação existem para que eles possam sonhar e realizar suas próprias travessias marítimas ou terrestres. O poder do relato é abrir caminhos. Gostaria que outras jovens pensassem ‘se ela consegue, eu também consigo’”.

Atualmente, Tamara realiza a fase final da sua jornada pelo Ártico. A navegadora está em uma região de fiordes, no mar da parte oeste da Groenlândia, na localidade de Ilulissat, um dos maiores centros urbanos da região autônoma da Dinamarca. Assim que voltar de viagem, o seu diário de bordo deverá ser transformado em mais uma obra. “Certamente haverá um livro, pois a maneira que tenho de agradecer a sociedade por me permitir fazer essa viagem é dar a outras pessoas a oportunidade de ir mais longe do que fui”, finaliza Tamara, que lançou em julho deste ano o livro “Nós: o Atlântico em Solitário”, no qual relata a sua jornada da França ao Brasil com apenas 24 anos.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895