Acolhimento em medidas socioeducativas

Acolhimento em medidas socioeducativas

Programa de Prestação de Serviços à Comunidade, da Universidade Federal do RS (Ufrgs), em Porto Alegre, preza pelo desenvolvimento humano e pela aproximação dos jovens com a escola, oportunidades e saberes

Após as oficinas, os socioeducandos confeccionam cadernos e jogos pedagógicos

Por
Daiana Garcia

Auxiliar no desenvolvimento pessoal de jovens, conscientizar e ampliar oportunidades são algumas das motivações de diferentes programas e iniciativas que promovem abordagens pedagógicas no cumprimento de medidas socioeducativas. Para além da simples aplicação, a busca é pela criação real e efetiva de novas possibilidades que auxiliarão adolescentes a ter uma fonte de renda, descobrir novas aptidões e vislumbrar caminhos guiados pelo ensino.

Um exemplo disso é o Programa de Prestação de Serviços à Comunidade (PPSC), uma extensão da Faculdade de Educação da Universidade Federal do RS (Faced/Ufrgs), em Porto Alegre. Com 26 anos de existência, desde 1997 trabalha no acompanhamento de adolescentes em cumprimento de medida na Universidade, por meio de convênio com a Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), da Prefeitura Municipal de Porto Alegre, gestora da política socioeducativa de meio aberto.

Já foram 1.800 adolescentes atendidos e mais de 150 estudantes (de graduação e pós-graduação) envolvidos nas atividades. A coordenadora do PPSC, Magda Martins de Oliveira, explica que as ações do programa se sustentam, entre outras questões, na ideia de conscientização de que o adolescente encaminhado para o cumprimento da medida encontra-se não só em uma situação peculiar de desenvolvimento humano, mas também está inserido, por vezes, em contextos adversos. 

Conscientização

“Trabalhamos experiências que possam contribuir com esse desenvolvimento. O fato de o estado responder com medida jurídica não quer dizer que haja um processo de conscientização do adolescente, por poder vislumbrar outras possibilidades para si e confiar nessas possibilidades.” Assim, Magda argumenta que a simples aplicação da medida pelo juiz, por exemplo, não dá conta disso, “vai depender de onde e como ele vai cumprir a medida”, ressalta.

Por isso, são desenvolvidas oficinas e atividades que não apenas instigam os socioeducandos a olhar para dentro de si e refletir, mas promovem o aprendizado de ofícios e saberes, com acompanhamento próximo de acadêmicos e bolsistas da Universidade. 

A coordenadora explica que os jovens vão acompanhados da família, para participarem de três oficinas iniciais, definidas conforme o histórico e as experiências do socioeducando. Ela destaca a importância em estabelecer essa relação com familiares, mas afirma que não há transferência de responsabilidade. “Estamos trabalhando a ideia de estar com a equipe, de estar com a família individualmente e, obviamente, quando esbarramos em alguma dificuldade, seja para cumprir com compromissos e ser assíduo, buscamos o auxílio familiar. Mas não há uma desresponsabilização do jovem, pois estaríamos esvaziando ele do próprio poder que tem. Por isso, mantemos uma relação direta.”

Ao frequentar as oficinas socioeducativas, que são uma experiência de reflexão, o jovem pode se permitir uma reconexão consigo mesmo, pensar talentos, projetos e refletir sobre padrões estabelecidos socialmente. “Ele começa a se perceber como um sujeito individual e entender que ele tem uma responsabilidade sobre a própria vida.”

Aproximação com escola

Além disso, existe um esforço para ressignificar o papel da escola na vida dos socioeducandos. “Eles estão há muito tempo desconectados da vida escolar e da escola como instituição social. Muitos não encontram sentido no estudo. E quando saem da escola, eles entram em uma situação de vulnerabilidade. Não estar na escola já é se colocar em uma situação de risco, pois eles ficam desconectados de uma experiência social muito importante, para além do que a escola traz de conhecimento.” 

Para apoiar essa conexão com o ensino, o PPSC aproxima os jovens de instituições de ensino com dinâmicas mais inclusivas, para que eles possam circular nesses espaços e continuar a fazer isso mesmo quando não estiverem mais no Programa. Em paralelo às oficinas, ainda existe um olhar mais singular e individualizado, com um dos bolsistas mantendo uma relação direta com o socioeducando, mantendo-se como uma referência para o jovem. Segundo Magda, assim é possível “fazer essa ponte entre desejos e a rede de políticas públicas, como saúde, educação e experiências com Jovem Aprendiz. Vamos ajudar ele a conhecer essa rede”.

Produtos para doação

Após finalizar as três oficinas do PPSC, o socioeducando ainda vai para um local onde vai desenvolver uma tarefa. Devido ao número reduzido de jovens e à drástica diminuição na aplicação de medidas socioeducativas, atualmente são trabalhadas tarefas em apenas dois espaços. 

“Hoje, trabalhamos com dois projetos de extensão, como o ‘Fio da meada’, que transforma materiais sobrantes da Ufrgs em cadernos. Eles customizam a capa ou trabalham com tinta; depois costuram o caderno e também fazem marca páginas. Então, esses cadernos são doados dentro da Universidade e para outras instituições.” E, ainda, no Ateliê de Jogos Pedagógicos, os socioeducandos também produzem, com materiais sobrantes, jogos educativos que são doados posteriormente. 

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895