Rachas da morte

Rachas da morte

Oscar Bessi

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Não foi um acidente de trânsito. Foi um assassinato brutal. A morte de um idoso de 69 anos em Porto Alegre pode até não ter sido premeditada ou intencional, pode talvez não ter sido motivada por um desejo louco de vingança ou encomendada por uma facção criminosa qualquer, mas foi sim, com toda certeza, uma morte que devia estar nas consequências previstas dos atos praticados pelos seus autores. Porque quem se mete nessa estupidez inadmissível de praticar rachas, seja onde for, está assumindo totalmente o risco de matar. É como sair atirando na rua. Pode acertar alguém, sim, com certeza. E se não quisesse que isso acontecesse, bom, então que guardasse a sua arma ou o seu carro, fosse fazer algo de útil e não nocivo. Que a Justiça seja implacável e esses assassinos fiquem por muito tempo longe das ruas, onde só foram capazes de causar dor e sofrimento a inocentes.

Com o terceiro trânsito mais violento do planeta, o Brasil segue vendo mais de 40 mil cidadãos serem vítimas todo ano do desrespeito praticado por condutores de veículos. Vítimas do descaso pela vida, da falta de consciência desses monstros que não deveriam, pelo certo, nem chegar perto de um carro, quanto mais dirigir. E não adiantou nem endurecer um pouco (ainda é pouco, com certeza) a legislação com penas mais duras contra quem pratica rachas. O brasileiro segue dando de ombros para leis e celebrando todos os dias a impunidade cultural que faz parte dessa nossa história volta e meia cambaleante. Vez ou outra, o desrespeito ao outro surge apelativo, celebrado como normal, adotado como postura coletiva que nos cerca. Triste. E é mais triste ainda assumir nossa incompetência educacional, nossa imoralidade intrínseca ao se dizer que, sem fiscalização, sem a ameaça de multa, guincho ou grades, não há como ter um trânsito civilizado. Daqui a pouco vão dizer que é necessário um exército de fiscais nas ruas ou então se terá a barbárie. Mas esses fiscais estarão o tempo todo em todos os lugares? Não é mais fácil simplesmente botar a mão nas consciência e mudar de atitude?

Essa vítima, na Capital, quando ainda criança perdeu as duas pernas. Passou uma vida inteira, décadas, lutando para viver com dignidade, superando as barreiras de um mundo desigual, se cuidando de perigos diversos e vencendo. Chegou aos 69 anos com garra, muito suor e determinação. Para, do nada, após tantas e tantas vitórias, ser vítima de criaturas que não merecem nada além do nosso olhar de desprezo. Loucos irresponsáveis que transformam a sua mediocridade em fera e ódio ao sentarem na  frente de um volante. Se 2023 é só mais um ano que começa com suas péssimas notícias, nós, enquanto sociedade, somos protagonistas dessas tragédias. Os culpados. Tudo poderia ser diferente e um carro ser apenas o conforto proporcionado pela genial invenção humana. Nada além de transporte, de uma facilidade para vencermos distâncias. Só. Mas vira uma máquina mortífera em mãos irresponsáveis. A culpa não é das máquinas. Mas do número cada vez maior de mentes criminosas que as pilotam.


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