As torcidas e a paz

As torcidas e a paz

Oscar Bessi

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Parece utópico pedir que as torcidas adversárias não briguem. “É do futebol”, dirá alguém. Discordo. Do futebol é o gol, o drible, a jogada perfeita, o erro inacreditável, o lançamento torto, a defesa fantástica, o frango, o pênalti, o impedimento, a bola na trave, a bola na rede. A violência não é do futebol. A agressão não é do futebol. A rivalidade? Sim, faz parte do esporte, e no futebol tem conotações apaixonadas. Colorados e gremistas, xavantes e aúreo-cerúleos, flamenguistas e vascaínos e por aí vai. Mas a rivalidade dentro das quatro linhas, que até admite brincadeira, gozação, vibração, corneta. Mas briga? Não, aí não tem nada a ver. Violência é apenas um ato de extrema burrice praticado por alguém cuja mente não consegue nada melhor. O problema é que ele não apenas se prejudica, como prejudica ao outro, às vezes de forma definitiva, ceifando vidas, negando futuros.

A má fase de um time hoje, que amanhã será glória e novamente má fase e outra vez glória e assim será sempre nessa gangorra que não poupa nem as maiores máquinas futebolísticas do planeta de uma hora estarem no topo, noutro momento sucumbirem sob maus resultados. E qual a lógica de praticar atos de violência em nome de um time? Prejudicar este com punições? Brigar com um semelhante por causa da cor de uma camiseta? Ora, o preço da gasolina subiu para colorados e gremistas, xavantes e canarinhos. Seja quem for campeão gaúcho, não vai ganhar desconto. Nem na conta da luz. Nem no gás de cozinha. Estão todos no mesmo barco. Como estão no mesmo triste barco os torcedores do Dínamo de Kiev e do Shakhtar Donetsk, que dividiam os títulos e as paixões dos campos de futebol ucranianos. Pois as bombas russas não escolhem torcedores de lá ou de cá. Atingem a todos. Sem perguntar antes. Na alegria e na tristeza, na guerra e na paz, somos todos iguais. Vermelhos ou azuis ou a cor que seja. O jogo passa. A vida segue. Dá para ser alegre, ser livre e ser bom para todos. Só depende de nós.

E, então, vou explicar porque não penso ser utópico pedir paz no futebol. E a explicação é muito simples. Milhares de partidas de futebol acontecem todos os dias, nos quatro cantos do mundo, em estádios milionários ou acanhados, em campos de barro, cimento ou capim. Em terrenos baldios. Em ruas, em praças e pátios de escolas. Estes jogos têm, sim, gritos, protestos, têm lances perdidos e vibração, têm paixão na ponta de cada chuteira ou dos pés descalços. Mas a esmagadora maioria desses jogos de futebol termina em paz. Entre torcidas, entre jogadores, entre todos. Então é possível sim, é muito possível fazer de um clássico da envergadura de um Gre-Nal ser apenas uma festa. Como foram os jogos na Copa do Mundo. Basta querer. Basta pensar melhor. Basta escolher dizer não para qualquer agressão ou excesso. Basta decidir pela paz. 


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