Nossas dores, nossos medos, nossos sonhos

Nossas dores, nossos medos, nossos sonhos

Oscar Bessi

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Confesso que foi um processo doloroso, pesado, quase desanimador escolher qual assunto abordar nesta coluna. Cada tema, cada assunto, vinha permeado de uma carga insuportável de tristeza que, ainda que exista a importância de tocar no assunto, de render uma última homenagem às vítimas do absurdo que parecemos viver, carregam consigo um fardo de tristeza imensurável. Toda violência, todo  crime que é noticiado, serve para que o leitor do nosso jornal tenha consigo um momento de reflexão. Um instante para entender e refletir sobre tudo o que é possível acontecer ao nosso redor, até conosco, e se prevenir, talvez mudando de atitudes, talvez apenas evitando certos males. Mas há o que não tem lógica. O que contraria todas as perspectivas e cria o pesadelo. É o lado injusto da vida que, infelizmente, também faz parte dela.

O 2º sargento Adair já poderia estar aposentado. Mas sonhava com uma última promoção e isso o levou a tantos anos além do necessário para conquistar o direito de descansar. A promoção significaria dias melhores para os seus filhos, então ele ficou, e sua contrapartida era oferecer a própria vida em risco na defesa da sociedade. E assim ele tombou. Numa cidade pequena, do interior, executado por um criminoso com quem tentou até dialogar. Quem espera algo assim? Quem espera que um garoto ensandecido invada uma creche armado com um facão e mate bebês inocentes e jovens professoras? Que lógica há nisto? Que explicação pode existir para tamanha crueldade? O desabafo do delegado que comandou a operação no Jacarezinho, Rio de Janeiro, publicado no Correio do Povo retrata esse estado de desânimo: “Não há o que comemorar”. Certo, 24 criminosos foram mortos, mas um policial perdeu a vida. E foi encontrado  um arsenal de guerra com fuzis, granadas, metralhadoras e todo o tipo de arma de fogo nas mãos dos bandidos. Armas para atacar e matar sem piedade qualquer um de nós.

A farsa familiar que matou o pequeno Henry Borel vai desabando. E os casos de violência se multiplicam, aos milhares, tão banais que alguém já pode achar que isso faz parte da rotina, que é normal, que temos que aprender a lidar e é o que resta. Não. Não pode ser assim. Precisei orar, antes de escrever. Não é possível que dores e medos roubem o lugar dos nossos melhores sonhos. O sargento Adair sonhava com uma vida melhor, e no rumo de seu sonho, assim como o policial civil do Jacarezinho, tombou. As crianças de Saudades (SC) estavam aprendendo os primeiros passos do sonhar. Mas acabou. Todos os dias, a cada nova manhã, milhões de brasileiros recomeçam sua caminhada em direção aos seus sonhos, possíveis ou não. E são tão simples, tão singelos. São sonhos pequenos. Honestos. Esperanças. Vamos insistir, prosseguir. E que Deus nos proteja.


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