Elas e o crime

Elas e o crime

(coluna de 09 de março de 2019)

Oscar Bessi Filho

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O protagonismo feminino avança em todos os sentidos. Tímido nalguns campos, reticentes ou resistente noutros. A parcela de mulheres inseridas na população economicamente ativa do país cresce a cada ano. Porém, sabemos que o Brasil traz consigo o peso de séculos sob uma cultura familiar patriarcal. Então não é fácil se livrar de certos cacoetes. Com enxergar a mulher sempre e apenas como a potencial vítima, um ser mais frágil, que deve ser protegida pelo homem. Então os debates tratam feminicídio, da violência doméstica, do abuso sexual e etc. Temas urgentes, sim. Mas a complexidade é ainda maior. Há a mulher protagonista da violência. Em índices cada vez maiores. E mostrar às novas gerações de meninas que o crime, esse péssimo exemplo masculino, não compensa, é outro desafio que precisa ser levado muito a sério.

No ano 2000, tínhamos cerca de seis mil mulheres presas no Brasil por cometer algum crime. Esse número aumento cerca de 700% de lá pra cá. É um índice alarmante para tão pouco tempo na história. Seguindo nessa batida, vai sobrar pouca mulher livre dentro de alguns anos. A proporção de crescimento da população carcerária masculina no pais, ainda que seja elevada demais, fora da normalidade e muito além do aceitável, cresceu, entretanto, num índice bem menor. Agora me perguntem: qual é a maior incidência de crimes dessas mulheres? Tráfico de drogas. É o crime em que se enquadra mais da metade dos casos que leva as mulheres brasileiras para trás das grades. E o tráfico de drogas nem é, digamos, encarado por elas como uma violência de grife. É sustento. O tráfico que as emprega, banca família, filhos, casa. E elas ingressaram, em sua maioria, levadas por homens. E as políticas públicas de inserção social e econômica, ou de geração de emprego e renda, não parecem ter força suficiente sequer para arranhar esse avanço. Vender drogas, atuar no ilícito lucrativo, compensa a fala de perspectiva e conquista, ainda que de forma ilusória e falsa, o respeito que não lhes é garantido numa vida normal, soterrada na lama da nossa miséria.

Mais mulheres no crime não é o andar natural do protagonismo delas, aquele que precisamos conquistar para a nossa sociedade. Mais mulheres no crime significa apenas um futuro ainda mais sombrio do que já parece. É o multiplicar das já diversas violências contra essas mesmas mulheres e contra todas as outras que as cercam. Significa que as fichas que apostamos na educação e na humanização ainda não são eficientes, nem suficientes, se é que podem ser consideradas. Significa criar gerações de filhos do crime sem a chance de um outro olhar fora desse campo minado. Significa olhar para a frente e não enxergar nada de bom.


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