Janelas abertas para personagens femininas na literatura infantojuvenil

Janelas abertas para personagens femininas na literatura infantojuvenil

Segmento infantojuvenil e a importância dos livros para formar leitores com pensamento crítico

Livros têm papel importante para novas descobertas

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A literatura infantojuvenil com personagens femininas, normalmente, era direcionada ao gênero de suas personagens e reforçava o estereótipo da donzela em perigo da Idade Média. Mas o pós-segunda guerra e as revoluções feministas ao redor do mundo levantaram questões sobre o papel da mulher e seu espaço na sociedade. No início do século XXI as histórias com personagens femininas para o público infantojuvenil já não eram mais direcionadas à identificação de gênero e, sim, para algo mais amplo, sensação de pertencimento entre os jovens, união e evolução pessoal. 

A obra Harry Potter conta com grandes personagens femininas relevantes como Hermione Granger que não faz o papel de moça frágil, mas daquela que lidera as aventuras com sua inteligência e capacidade de aprender. Com a popularização das distopias tivemos uma desconstrução de protagonistas femininas, como Jogos Vorazes que conta com a personagem principal Katniss Everdeen que assume o papel de líder da revolução contra um governo totalitário, corroborando com a importância de Mafalda (1964), que nas tirinhas de Quino questionava os papéis de gênero e de governos corruptos. “Jovem não gosta de livro grosso. Adolescente não gosta de fantasia. Uma série de suposições foram desconstruídas com a publicação de Harry Potter”, conta a professora Ana Paula Cecato, que foi membro da Câmara Rio-Grandense do Livro.
 
Ana Paula aborda o fato de que, na infância, as meninas são mais participativas, tomam mais a iniciativa. Mas conforme seu crescimento vão sendo silenciadas, rotuladas, intimidadas e se limitam a fazer o óbvio e seguir a cartilha porque será vítima de todo o tipo de julgamento. É levantada também a questão dos pais e professores no empoderamento dessas meninas, nas discussões de suas descobertas e de que não há necessidade de discutir sexualidade de forma explícita, há outros meios como trabalhar uma obra literária que traz todas essas questões que emergem pela via do simbólico. “É através do simbólico serão elaboradas essas questões próprias da realidade, da existência. A literatura constrói realidades", observa.

A escritora e professora com pós-doutorado em Literatura, Jane Tutikian, e Ana Paula relatam a falta de visibilidade da literatura infantojuvenil pela mídia, priorizando apenas o segmento adulto, mesmo que, nas listas dos 10 livros mais vendidos no mundo, figurem três títulos para o público infantil e juvenil, como Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll, com 100 milhões de vendas aproximadas, o já citado Harry Potter, de J.K. Rolling, cujas vendas aproximam-se dos 130 milhões de exemplares, e O Pequeno Príncipe de Antoine de Saint-Exupéry, entre 150 e 180 milhões.

“A mídia cobriu com um manto de invisibilidade a literatura infantojuvenil. Fora da Feira do Livro, quando saiu uma boa matéria sobre um livro infantojuvenil? Literatura é paixão! Como se apaixonar e transmitir ao jovem leitor a paixão por aquilo que não conhece? Fazemos, aqui, uma das melhores literaturas infantojuvenil do Brasil”, conta Jane. Ana Paula foi mais além e comentou sobre a divulgação das próprias feiras: “A mídia cobre muito mais a parte da literatura adulta e, por vezes, até nomeia uma programação principal. A própria divulgação do evento não traz, não divulga tão bem a área infantil. Se a gente pensar no próprio espaço físico, a área infantil está lá em um cantinho ou a programação não tem uma curadoria”.

Ana Paula acredita que o comportamento dos jovens nesta nova narrativa entre o livros infantojuvenis é reflexo de anos de luta e conquista feminista, de políticas públicas adotadas por governos, por debates de gênero, leis como a Maria da Penha, que traz a discussão tanto para as salas de aula, quanto para as salas de várias famílias. “Eu vejo nestas crianças e jovens uma naturalidade maior, que não tinha na minha geração, em trabalhar essas questões, em falar sobre essas questões. Claro que ainda existe uma fala muito preconceituosa, mas existe uma possibilidade de dialogar sobre essas questões e isso está relacionado com a democracia. E apesar dos desmontes das políticas públicas, eu vejo nascer esperança nestas gerações. A importância de formar leitores vai fortalecer essas lutas”.

Já Jane Tutikan acredita que isso tenha haver com o julgamento equivocado sobre os jovens. “É o tempo em que estamos vivendo, que exige que a mulher lute, ainda, pelo seu espaço, embora todas as conquistas já obtidas. E isso diz respeito a elas também. Ao contrário do que se pensa, o adolescente não é, absolutamente, um alienado fechado no seu próprio mundo. Ele tem informação constante, ele está mais inserido no mundo do que nunca. O espaço de Jogos Vorazes é também um país distópico. Isso deve dizer alguma coisa a nós adultos. Mas é importante que eu diga que considero Jogos Vorazes mais um fenômeno de marketing do que um fenômeno literário”. A leitora Kauani Simon, de 15 anos, traz a experiência de uma jovem e reforça a significância do protagonismo feminino nesta faixa-etária. “Eu gosto de ler livros com protagonistas femininas porque eles mostram a força, a garra de uma mulher, onde elas lutam, elas correm, elas vão em frente para conseguir o que elas querem. Acho que é por isso que esses livros são os meus preferidos”.

Jaqueline Witter /UFSM-FW
Kassiane Michel / Feevale
Ketelin Gomes / UniRitter 


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