Cubanos pedem liberdade

Cubanos pedem liberdade

Manifestações sacodem o regime

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      Cubanos saíram às ruas gritando "abaixo a ditadura" e "não temos medo". Por que essas palavras de ordem e não outras?
Cuba é uma ditadura. Assim como a Arábia Saudita. A direita só enxerga o autoritarismo da primeira. A esquerda, da segunda. Estive duas vezes em Cuba. Na primeira, em artigo que rodou muito, caracterizei a ilha dos Castro como uma “favela no Caribe”. Na segunda, confirmei as minhas impressões. Tenho um amigo que morou seis anos lá. Conta os horrores do cotidiano com minúcias. Cuba nunca passou no teste 6LD (seis eles de democracia): liberdade de ir e vir, liberdade de expressão, liberdade de oposição, liberdade de organização partidária, liberdade de culto e liberdade de orientação sexual. Algumas “democracias” podem vacilar em algum desses quesitos. Ditaduras claudicam em todos. Já imagino a indignação de alguns.

      Uma parte dos problemas de Cuba vem do embargo econômico imposto pelos Estados Unidos. A outra parte vem do modelo político ditatorial. Mesmo sem embargo Cuba seria uma ditadura. O embargo não pode ser responsabilizado por prisões de opositores e de homossexuais, o que aconteceu ao longo do tempo. Fidel e os seus guerrilheiros derrubaram uma ditadura. Impuseram outra. Durante muito tempo, Cuba foi sustentada pela União Soviética. Depois, acabou. Na minha segunda viagem a Cuba, entrevistei um dos maiores escritores do país. Tive de publicar a entrevista sem o nome dele para que não fosse perseguido. Consigo entender que um país regre a entrada de pessoas. Não posso aceitar que uma nação impeça alguém de sair se tiver para onde ir e não estiver condenado a alguma pena a cumprir por algum crime.

      Uma vez, quando me envolvi numa polêmica e consegui a proeza de ter todos contra mim, um ícone da direita e outro da esquerda, com um dia de diferença, me disseram o mesmo: escolha um lado para não ficar sozinho. Nunca escolhi. Continuo só. Odeio o fascismo. Odeio ditaduras de direita e esquerda. Rejeito o comunismo e o neoliberalismo. Nada mais tosco do que dizer “vai pra Cuba” para quem critica o capitalismo selvagem e desregrado. Dos modelos sociopolíticos disponíveis no mercado, o da Suécia, que errou feio no combate à pandemia, é o que mais me agrada. Jovem anarquista, tornei-me um velho socialdemocrata. As manifestações em Cuba me alegram. É tempo de se libertar. Cuba avançou em saúde. Excelente. Nada fez pela liberdade. Não há pluralismo. Fiz dois amigos lá: Marcela e José (pseudônimos).

      Na primeira vez, me mostraram em tom de segredo suas “santerias”, um oratório escondido num armário da cozinha. Era proibido crer em Deus. O mundo não precisa de políticos como Donald Trump, Viktor Orbán, Duterte e outros de mesma ideologia de extrema direita. Nem dos herdeiros designados pelo castrismo cubano. Partidos não podem controlar constituições. Partido só fez sentido havendo outras partes. A democracia ocidental, parafraseando Churchill, continua sendo a pior forma de governo. À exceção de todas os outras, inclusive a cubana.

Cuba poderia realizar plebiscitos para saber se os cubanos querem continuar como estão ou ter democracia. Se querem um partido só ou pluripartidarismo. Enfim, se querem encerrar a revolução e passar por uma metamorfose?

Alguns defendem Cuba por horror a tudo que os americanos já fizeram sustentando ditaduras de direita como a que foi implantada no Brasil em 1964. Outros, ao continuar apoiando Cuba, revelam que nunca serão democratas. Afinal, a "democracia burguesa" não os satisfaz. Caminhante faz caminho sozinho.


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