Inteiros

Inteiros

Alina Souza

Casal de namorados na Praça da Alfândega, Porto Alegre.

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Embalados por algo enraizado na cultura, alguns desejam ter namorado para fugir da solidão. Tal anseio comporta armadilhas. Como “ter” namorado se as pessoas não são posses, objetos? Outra questão perigosa advém do medo de estar só consigo mesmo. Há quem não suporte sua própria companhia, mas espera que o outro aguente o azedume. Oferece, portanto, uma presença carcomida pelas sombras. Ao menor sinal de carência, começa a procura por alguém que lhe preencha o vazio. Para piorar, certos discursos incentivam a encontrar “a parte que lhe falta”. A metade da laranja. Pois me chamem de chata, sou contra tudo isso. O amor não nos completa: nos acrescenta, isso sim. Somos inteiros. Ou devemos ser, eis a nossa luta de cada dia. Bom mesmo é somarmos nossas inteirezas. O corretor de texto aponta como inexistente esta palavra, mas não importa, a inventamos. Quero falar de situações cheias, transbordantes, da gente que carrega tanto amor por dentro que resolve multiplicá-lo. Abre a alma como quem abre a casa arrumada. Convida a um passeio no qual cada um mergulha em seu devaneio, vê a seu modo a paisagem e, na leveza dos planos, os olhos se cruzam, confiam, confidenciam as observações.


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