Novo comando na Polícia Civil

Novo comando na Polícia Civil

Fábio Motta Lopes é delegado de Polícia desde 1999

Correio do Povo

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Natural de Santa Cruz do Sul, o novo Chefe de Polícia Civil, Fábio Motta Lopes, 46 anos, é casado e com três filhos. Delegado de Polícia desde 1999 e já quarta classe da carreira, ele se define como “alguém extremamente dedicado ao trabalho, moderado, com um perfil de conciliador”. Diante do desafio de comandar a instituição, o delegado afirma que busca “decidir ou estabelecer diretrizes com base no bom senso e ouvindo os demais colegas que também estão na administração da Polícia Civil”. Ele acredita que as principais características que possui para coordenar a instituição, ao lado do subchefe de Polícia, delegado Vladimir Urach, e dos diretores de departamento, são “a experiência e o conhecimento da Polícia Civil e das suas atribuições, bem como da maior parte das necessidades e dos anseios dos policiais civis”, além da “maturidade e tranquilidade que o gestor deve ter para a tomada de decisões, especialmente nas situações de maior complexidade”.

Qual será a marca da sua gestão?

Como eu já fazia parte da atual direção superior da Polícia Civil, na função de subchefe de Polícia, a principal marca será a continuidade das diretrizes que foram estabelecidas no começo de 2019, quando a delegada Nadine Anflor assumiu a função de chefe de Polícia e eu a de subchefe de Polícia. Dessa forma, seguiremos dando atenção especial para as investigações dos homicídios, dos latrocínios (roubos com morte) e dos demais crimes tradicionais cometidos com violência ou grave ameaça, especialmente aqueles que são praticados com emprego de arma de fogo, como os roubos de veículos, a estabelecimentos comerciais, a residências e a pedestres. Tenho dito que a Polícia Civil, ao longo dos anos, vem trabalhando muito bem, principalmente nos delitos citados e em outros casos que geram repercussão, no sentido de identificar os criminosos e de adotar as medidas de polícia judiciária para a prisão desses indivíduos. E isso deve continuar acontecendo. Não obstante, quando se está diante de ações praticadas por organizações criminosas, deve-se ir além: adotar medidas destinadas ao enfraquecimento financeiro dessas estruturas. A Polícia Civil já vem adotando essa estratégia nos últimos anos.
Assim, incentivar e fomentar a constante evolução dessas investigações que visam ao ataque patrimonial das organizações criminosas é outra diretriz que pretendemos manter, com o aumento de inquéritos policiais para apuração dos crimes, por exemplo, de lavagem de dinheiro, em que essas medidas constritivas dos bens e valores oriundos do mundo do crime poderão ser adotadas. Também se deve ter uma atenção especial com relação à violência de gênero, com o intuito de se reduzir o número de feminicídios no Estado. Destacaria igualmente a frequente necessidade de se melhorar o acolhimento e o atendimento ao público nos órgãos policiais, já que a população é a destinatária final do trabalho realizado pela instituição. Por fim, também sublinharia a necessidade de a Polícia Civil, a exemplo das demais forças ligadas à segurança pública, continuar observando as diretrizes do Programa RS Seguro, que fomenta a integração entre as forças de segurança pública e a constante troca de informações entre os órgãos de inteligência.

Como o senhor avalia o atual quadro da segurança pública no RS?

Nos últimos anos, os principais indicadores de violência e criminalidade, em linhas gerais, estão em constante redução no Rio Grande do Sul. Como exemplos dessa diminuição podem ser citados os delitos de homicídios e de roubos de veículos. No caso específico do roubo de veículos, se fizermos uma análise dos dados dos últimos 12 meses, houve uma redução superior a 30% nos casos. Levando-se em consideração que esse era indicador que já vinha em constante diminuição, trata-se de um dado extremamente positivo. Uso esses exemplos porque são crimes em que não há a subnotificação, ou seja, em razão da natureza dessas infrações penais, todos os fatos ocorridos chegam ao conhecimento da Polícia Civil. Assim, não resta dúvida de que se está no caminho certo para a contenção da criminalidade no Estado. Os números demonstram o acerto das medidas adotadas pelos órgãos de segurança nos últimos anos. A investigação criminal, que é a principal atividade exercida pela Polícia Civil, possui um papel fundamental nesse processo. Por outro lado, os desafios para a manutenção dessa constante redução são grandes, até para que se chegue a patamares ideais em todos os municípios do Estado, como, por exemplo, números de até dez homicídios para cada grupo de 100 mil habitantes, conforme preconiza a ONU. Em suma, apesar de termos muito trabalho pela frente, avaliamos como positivo o atual quadro de segurança pública no Rio Grande do Sul, principalmente diante dos resultados alcançados até agora.

Em relação ao conflito entre facções em Porto Alegre e Rio Grande, o que mais pode ser feito?

Essas disputas que acontecem em Porto Alegre e em Rio Grande são excepcionais, pontuais, sazonais. Não se está dizendo, com isso, que não sejam fatos graves ou que não mereçam atenção especial por parte do Estado. Entretanto, as polícias estão agindo com firmeza, dentro da legalidade, logicamente. No âmbito da Polícia Civil, as investigações dos homicídios que ocorreram estão sendo feitas de forma prioritária, com a celeridade possível para identificação dos criminosos e para adoção das medidas cautelares necessárias, entre as quais as prisões preventivas dos autores, tanto executores como mandantes. Os principais líderes, que são as pessoas da organização criminosa que dão a ordem para essas mortes nas ruas, já estão identificados e sendo responsabilizados. Estão ocorrendo transferências de presos em algumas casas prisionais prisional e outras, sempre que necessárias, poderão ser realizadas. Há constante troca de informações entre os órgãos de inteligência das polícias. As demais instituições também estão agindo. A Polícia Civil, igualmente, está realizando ações de repressão a outros delitos que se relacionam com os homicídios que foram praticados, como o tráfico de drogas e o roubo de veículos, por exemplo. Com esse trabalho integrado que está sendo feito, com o engajamento das polícias e de outras instituições, entre as quais o Ministério Público e o Poder Judiciário, o resultado já está aparecendo, com a rotina da vida dos moradores dessas regiões voltando à normalidade.

A gestão da delegada Nadine Anflor tinha como uma das marcas atenção à violência contra a mulher, feminicídios.

Deve-se, sim, ter uma atenção redobrada com relação à violência doméstica e familiar contra as mulheres. Essa sempre foi uma das marcas da delegada Nadine, uma especialista no assunto e que trabalha contra esse tipo de violência de gênero há anos. Trabalhei com ela nos últimos cinco anos. Conheço bem a política estabelecida pela delegada Nadine dentro da Polícia Civil, como a criação das Salas das Margaridas, espaço adequado para o acolhimento, nas Delegacias de Polícia, das mulheres vítimas de violência doméstica e familiar e que já existe em dezenas de órgãos policiais. A nossa ideia é, sim, a manutenção dessas diretrizes, especialmente para que se consiga romper o ciclo de violência antes que ela se transforme em feminicídio. Sabemos que é um problema social, que decorre da cultura do machismo, mas a Polícia Civil é parte importante da rede voltada à prevenção e à repressão da violência contra a mulher, por ser, na maioria das vezes, a primeira instituição pública a ser procurada pelas vítimas desse tipo de agressão e a responsável por remeter ao Poder Judiciário os pedidos para a concessão de medidas protetivas de urgências.

Um dos caminhos na luta contra o crime são as delegacias especializadas?

A especialização dos órgãos policiais que irão investigar determinadas infrações penais, como roubos a bancos, homicídios, roubos de veículos e de cargas, tráfico de drogas, entre outras, é medida fundamental. Como referi anteriormente, estou na direção superior da Polícia Civil desde o começo de 2019. Desde então, as medidas que reputávamos importantes, no âmbito da especialização das investigações criminais, foram adotadas, não havendo a intenção, no momento, de criação de novos órgãos policiais. A título exemplificativo, estabelecemos que, na Capital, as investigações referentes aos roubos e furtos de veículos, que estavam sendo feitas pelas Delegacias de Polícia Distritais, órgãos policiais responsáveis pelas apurações de um volume muito grande das mais variadas infrações ocorridas nas suas respectivas circunscrições, foram centralizadas no Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic). Com essa especialização, a Polícia Civil conseguiu mapear melhor esses crimes, com a identificação e a responsabilização criminal dos principais criminosos que vinham cometendo furtos, roubos e receptações de veículos, em um trabalho integrado com outras instituições. Em síntese, essa medida fez com que um único órgão se dedicasse, exclusivamente, às investigações dessas infrações penais na Capital.

Outro exemplo foi a incorporação das seis Delegacias de Polícia de Homicídios e de Proteção à Pessoa da Região Metropolitana (Canoas, São Leopoldo, Novo Hamburgo, Alvorada, Gravataí e Viamão), que estavam vinculadas ao Departamento de Polícia Metropolitana, ao Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP). Essa mudança possibilitou uma maior agilidade na troca de informações entre os órgãos especializados nas apurações dos homicídios e uma estruturação melhor das investigações preliminares nos locais de crime, com a criação de equipes volantes que passaram a atender, além de Porto Alegre, os municípios citados. O resultado dessas medidas citadas, além de outras adotadas internamente e pelas demais instituições de segurança pública, é a redução dos indicadores de roubos de veículos e de homicídios, conforme já mencionamos. Também foi instalada na atual gestão a Delegacia de Polícia de Investigação de Crimes Carcerários (DICAR), órgão policial responsável pelas investigações dos crimes cometidos nas casas prisionais, especialmente por líderes de organizações criminosas, e foram reestruturadas as atribuições e áreas das Delegacias de Polícia especializadas na repressão aos crimes rurais (Decrab).

Como está a Polícia Civil no Interior?

O Interior do Estado conta hoje com 17 Delegacias de Polícia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco), órgãos especializados que possuem a atribuição para a investigação, entre outras situações, dos delitos praticados por organizações criminosas, como a lavagem de dinheiro, o tráfico de drogas e determinados roubos (roubo a bancos, a transporte de valores e de cargas). A Polícia Civil, no Interior, sempre realizou um trabalho de excelência. Os nossos policiais civis que atuam no Interior do Estado são profissionais que agem com extrema dedicação, preparados para a investigação de qualquer infração penal e os grandes responsáveis por essa qualidade na prestação dos serviços de polícia judiciária. Sabemos, porém, que algumas estruturas prediais estão bem aquém das necessidades e dos espaços adequados que merecem os nossos policiais civis e a comunidade que é atendida nas Delegacias de Polícia. Em razão disso é que se deve ter um olhar especial para que sejam melhoradas as estruturas físicas de alguns órgãos policiais.

No campo operacional, como o crime organizado não respeita limite territorial e, por isso, já migrou para o Interior do Estado, todas as regiões policiais receberão, nos próximos dias, ferramentas tecnológicas que contribuirão para as investigações criminais. Além disso, a troca de informações entre o órgão central de inteligência da Polícia Civil (Gabinete de Inteligência e Assuntos Estratégicos – GIE) e os serviços de inteligência existentes em todas as regiões policiais tem sido, cada vez mais, fomentada.

Em termos de condições de trabalho, estruturas, novos servidores…..o que vem por aí?

Recentemente, foi inaugurada a primeira etapa da Cidade da Polícia, uma área de aproximadamente 13 hectares, situada na Zona Leste de Porto Alegre, e que será um centro de excelência em investigação criminal, abrangendo boa parte dos órgãos operacionais da Polícia Civil. Assim, projetos voltados à obtenção de recursos financeiros para a reforma das demais construções existentes no local estão sendo feitos. Isso permitirá que, em breve, outros órgãos passem a funcionar nessa área, aumentando, assim, a troca de informações entre os policiais civis e reduzindo-se o valor gasto com alguns aluguéis. Há projetos, também, para a melhoria das estruturas no Interior do Estado. Em Rio Grande, por exemplo, identificou-se um prédio que atende melhor as necessidades da Polícia Civil, razão pela qual está tramitando um processo para que essa estrutura seja disponibilizada à instituição.

Com relação a novos servidores, por enquanto, está sendo cumprido, rigorosamente em dia, o cronograma estabelecido pelo Governo do Estado para o chamamento daqueles que foram aprovados nos concursos públicos da Polícia Civil. No momento, estão realizando o curso de formação na Academia de Polícia Civil, aproximadamente, 270 alunos. Desse total, 21 são do concurso de delegado de polícia. Os demais, que deverão ingressar na instituição na segunda quinzena de maio, são do concurso de agentes de polícia (escrivão ou inspetor).

Em relação ao programa Avançar na Segurança...o que ficou para ser realizado na tua gestão?

O programa Avançar na Segurança é outro fator importante para o controle da criminalidade. Os recursos destinados pelo Governo do Estado para investimentos na segurança permitirão que a Polícia Civil renove a sua frota de viaturas, com carros semi blindados, e as suas estações de trabalho para a elaboração dos inquéritos policiais eletrônicos, com computadores com excelente capacidade de processamento e todos com duas telas. Além disso, armamento, como fuzis e pistolas, e ferramentas tecnológicas que são fundamentais para as investigações criminais estão sendo adquiridos com recursos do Governo do Estado.

Somente nessas tecnologias o investimento é superior a R$ 23 milhões. É importante mencionar também que algumas das viaturas já foram entregues no mês passado, mas a maior parte desses equipamentos (novos veículos, armamento, ferramentas tecnológicas de inteligência) será entregue nos próximos dias, possibilitando uma eficiência e uma agilidade maiores em determinadas investigações criminais.

Como será a tua relação com outras instituições?

A integração entre todos os órgãos públicos que atuam na área da segurança pública é essencial para a prevenção dos crimes e para a repressão qualificada dos delitos. Nos 23 anos que atuo como delegado de polícia, posso afirmar que a integração hoje é efetiva, com respeito mútuo entre as instituições, com troca constante de informações entre as agências de inteligência policial e com a realização de operações em conjunto. Essa real integração é, portanto, uma medida que está contribuindo, significativamente, para a redução dos indicadores de criminalidade nos últimos anos, razão pela qual deve ser mantida como um norte para qualquer gestor no âmbito da segurança.

O que a Polícia Civil representa na tua vida?

A Polícia Civil representa muito na minha vida. Sou filho de delegado de polícia aposentado. A minha esposa e o meu irmão também são policiais civis. Sempre convivi com policiais civis e desde cedo frequentava delegacias de polícia. Aprendi a admirar e reconhecer a importância do trabalho investigativo desenvolvido pela Polícia Civil quando ainda era adolescente. Assim, nunca tive dúvidas de que iria fazer Direito para prestar o concurso público para delegado de polícia. Se consegui me formar, fazer cursos de pós-graduação e também chegar à docência universitária, devo tudo à Polícia Civil. Também devo à instituição a possibilidade que hoje tenho de dar uma vida digna aos meus filhos. Ser Chefe de Polícia é o coroamento para qualquer delegado de polícia, por se tratar do maior posto existente na instituição e por representar o reconhecimento profissional em razão de diversos trabalhos de investigação criminal e de gestão administrativa realizados ao longo dos anos. É, sim, motivo que deixa o escolhido lisonjeado, apesar de serem grandes as responsabilidades decorrentes do exercício da função.


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