Cláudio da Silva Oliveira: Planejamento do GHC para a pandemia iniciou em janeiro

Cláudio da Silva Oliveira: Planejamento do GHC para a pandemia iniciou em janeiro

Luciamem Winck

Diretor-presidente do Grupo Hospitalar Conceição, Cláudio da Silva Oliveira, assumiu oficialmente o cargo no dia 15 de maio

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Aos 37 anos, o diretor-presidente do Grupo Hospitalar Conceição (GHC), Cláudio da Silva Oliveira, afirma estar, em meio à pandemia, estar vivenciando o seu maior desafio profissional. Administrador por formação, com MBA em Administração Pública, Oliveira é acadêmico de Direito. Ex-secretário de Saúde em Turuçu (2009-2010), ex-diretor do Porto de Pelotas (2015/2019) e ex-diretor Administrativo e Financeiro do GHC (2019-2020), avalia que antes de antes de aplicar o lockdown, é preciso adotar medidas de conscientização da população, com ênfase no uso de máscara e do álcool gel, higienização das mãos e a evitar aglomerações. Somente desta forma, acredita, será possível controlar a disseminação do vírus.

Correio do Povo: Como e quando aconteceu o planejamento do Grupo Hospitalar Conceição para enfrentar a pandemia?

Cláudio da Silva Oliveira: O planejamento do Grupo Hospitalar Conceição para a pandemia iniciou em janeiro. Tivemos a primeira reunião com os coordenadores da assistência em 31 de janeiro, apresentando nosso Protocolo e o Plano de Contingência. A partir de fevereiro iniciamos o treinamento das equipes. E em março, começamos a receber os primeiros pacientes com a Covid-19.

CP: Quais as maiores dificuldades encontradas neste período de enfrentamento à Covid-19 e como está sendo para vencê-las?

Cláudio da Silva Oliveira: Existem várias dificuldades encontradas. A primeira foi em março para comprar as máscaras N95, estava em falta no mercado mundial. Tivemos bastante apreensão, mas conseguimos a compra quase no final de março e uma doação do Ministério da Saúde. Que deixou nossos estoques estável. Outra dificuldade é a contratação de médicos intensivistas. Fizemos um concurso em 10 de maio e esperávamos para julho o início dos aprovados. Para nossa surpresa, os aprovados eram na maioria médicos-residentes, portanto, ainda sem a conclusão da especialização e impossibilitados de assumir. Agora estamos com um Processo Seletivo Simplificado, onde esperamos poder contratar mais médicos intensivistas.

CP: Quantos profissionais da saúde vinculados ao GHC já contraíram a doença e, por conta disso, necessitaram se afastar das atividades? Há dificuldade de substituição dos recursos humanos? Quantos seguem afastados por terem sido classificados no grupo risco?

Cláudio da Silva Oliveira: No GHC desde o começo da pandemia já tivemos 806 profissionais contaminados com a Covid-19, destes, 427 já retornaram às suas atividades e 379 seguem afastados, em isolamento domiciliar, na sua grande maioria. Já testamos mais de 4.500 profissionais de saúde. Temos muita dificuldade de substituir sim. Muitos desistem no treinamento. Seguem afastados os funcionários acima dos 75 anos. São 54 funcionários, nesta situação. Os outros que são considerados grupo de risco, foram realocados das áreas de contato com a Covid-19.

CP: Que tipo de medicamentos usados no tratamento dos pacientes Covid-19 deram melhores resultados no GHC?

Cláudio da Silva Oliveira: É importante ressaltar que até o momento não há medicação específica para o tratamento do coronavírus. Há medicações sintomáticas que podem ser utilizadas conforme o estágio evolutivo que se apresenta a doença. Portanto, o tratamento medicamentoso pode variar de paciente para paciente. Usualmente, tem sido utilizada uma combinação de antibióticos como a amoxicilina e clavulanato e azitromicina (este último também apresenta ação anti-inflamatória pulmonar). Em pacientes em estágio inflamatório mais avançado, tem sido utilizado corticóide em doses elevadas (dexametasona, por exemplo) associado com ivermectina. Esta última, já tem sido utilizada no passado quando se faz necessária a terapia com altas doses de corticoide para se evitar parasitose intestinal (principalmente a estrongiloidíase) que pode ocorrer com a imunossupressão associada. Há relato científico de diminuição importante da mortalidade (em até 30%) com a utilização de corticoterapia em altas doses.

CP: O GHC realiza algum experimento em busca da cura dos pacientes considerados graves?

Cláudio da Silva Oliveira: Como o Hospital Nossa Senhora da Conceição é um dos hospitais referência do Ministério da Saúde para o tratamento dos pacientes acometidos com a Covid-19 em Porto Alegre, é natural se esperar que estudos científicos ocorram em nosso hospital referentes a todos aspectos da doença. No momento, estão ocorrendo 16 estudos científicos em nossa instituição e outros estão em fase de avaliação. Há vários estudos multicêntricos e internacionais. Vários aspectos estão sendo estudados, entre eles, aspectos do diagnóstico clínico e laboratorial, medidas de prevenção, avaliação dos pacientes, avaliação e desempenho da equipe de saúde, avaliação da evolução da fisiopatologia da doença e tratamento medicamentoso. Uma das drogas pesquisadas é o acalabrutinibe, o qual é originalmente um medicamento utilizado no combate ao câncer que está mostrando indícios de que pode ajudar pacientes hospitalizados com Covid-19 a superar manifestações graves da doença, em um momento em que os pesquisadores tentam adaptar os tratamentos existentes para combater a infeção.

CP: Como foi organizada a ação de recuperação dos respiradores?

Cláudio da Silva Oliveira: Os respiradores que foram recuperados, foi uma ação conjunta da nossa engenharia biomédica e gerentes de internação que entraram em contato com as empresas que fabricam os respiradores. Foi uma ação essencial para abrir mais leitos de UTI.

Como você avalia o momento atual da pandemia? A evolução está dentro do esperado ou superou as expectativas?

Cláudio da Silva Oliveira: Sabíamos que neste momento nossas emergências teriam uma alta procura. Historicamente nesta época tem mais procura. E as UTIs têm uma taxa de ocupação acima dos 90%. Portanto, está dentro do esperado.

CP: Como é a rotina dos atendimentos no GHC? O momento mais feliz ainda é ver um paciente deixando a UTI sob aplausos?

Cláudio da Silva Oliveira: A rotina é desgastante, temos reunião diariamente no gabinete de gerenciamento de crise, com intuito de discutir com as equipes do Conceição, todos os gargalos e deficiências que possam existir. Com certeza saber da alta de pacientes com a Covid-19 é motivo de alegria.

CP: A morte de pacientes Covid-19 lhe causa algum tipo de frustração?

Cláudio da Silva Oliveira: Fico sabendo dos óbitos logo em seguida. Obviamente, ficamos consternados e não queremos esse tipo de notícia. Gostaríamos que não tivesse nenhuma.

CP: Como foi assumir o comando do GHC interinamente em 17 de abril e ser confirmado no cargo em 15 de maio em meio a uma guerra contra o novo coronavírus? Este é o seu maior desafio profissional?

Cláudio da Silva Oliveira: Posso afirmar que é o maior desafio profissional. Tive um test-drive ao assumir o Porto de Pelotas em 2015, um porto com pouca utilização. Quando saí da chefia, estava operando quase 1 milhão de toneladas/ano. Foi um belo desafio também. Mas com certeza, assumir um grupo do tamanho do GHC, é o maior desafio até o momento.

CP: O GHC é o maior complexo de saúde do Sul do Brasil, tendo mais de 9.200 empregados, sendo responsável por mais de 35% do atendimento do Sistema Único de Saúde da região Metropolitana, e agora ocupa um espaço de destaque no combate aos efeitos do Covid-19. Quais são os desafios futuros?

Cláudio da Silva Oliveira: O pós-pandemia será para reorganizar a casa e voltar à rotina normal. Suspendemos nossas cirurgias eletivas e vários atendimentos, o que fez nossa produção cair vertiginosamente. Nosso desafio será colocar os atendimentos nos trilhos e voltarmos a atender a pleno.

CP: Como o Hospital Nossa Senhora da Conceição se tornou referência para o tratamento do Covid-19?

Cláudio da Silva Oliveira: É aprendizado constante, a cada dia uma lição. Eu digo para os mais próximos que estamos fazendo um doutorado na prática. Sairemos melhores desse período e aprendendo com as falhas que possam existir e com os acertos também.

Além do Conceição, o GHC montou uma Central de Triagem para atendimento de pacientes com sintomas do novo coronavírus e uma área específica na UPA Moacyr Scliar, também para atendimento do Covid-19, além de uma retaguarda de 18 leitos de UTI, caso necessário, no Hospital Cristo Redentor.

CP: Como está sendo administrar todas essas portas de entrada de pacientes vítimas da pandemia?

Cláudio da Silva Oliveira: Devemos passar por um período de maior procura das nossas emergências ainda em agosto. Acredito que setembro comece a estabilizar e diminuir os casos. É a minha expectativa.

CP: Na sua avaliação, estamos próximos de um colapso das UTIs?

Cláudio da Silva Oliveira: Fazemos parte de um sistema de saúde que é coordenado pelo gestor municipal. Acredito que se chegarmos no nosso máximo, o município irá destinar os pacientes que nos procuram para outros hospitais que estão atendendo a Covid-19.

CP: O lockdown seria uma alternativa para frear a disseminação do vírus?

Cláudio da Silva Oliveira: Lockdown tem sua eficácia em duas ou três semanas. Se fosse fazer só teríamos reflexos no sistema de saúde depois desse período. Imagino que antes de aplicar lockdown temos que intensificar na conscientização da população, uso de máscara, higienização das mãos, álcool gel e o mais importante, sem aglomerações. Com isso acreditamos que conseguimos controlar a disseminação do vírus.


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