Aventura para ajudar pessoas

Aventura para ajudar pessoas

Apaixonada por aventuras, natureza e medicina, a médica paulista Karina Oliani foi a primeira brasileira a se especializar no curso de medicina de emergência e resgate em áreas remotas Wilderness Medicine.

Paula Maia

Médica Karina Oliani

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"A montanha traz uma analogia muito poderosa com a vida. Em 2013, eu escalei pela primeira vez pela face sul. Essa escalada é menos técnica, mas eu não acredito que seja mais fácil, porque às vezes morre mais gente. A parte sul eu acho mais bonita. Durante os acontecimentos dessa expedição, tive que tomar muitas decisões. Fui posta à prova, algumas vezes, em vários sentidos."

Na palestra ‘Qual o Seu Everest?’, o que a senhora aborda?

A montanha traz uma analogia muito poderosa com a vida. Em 2013, eu escalei pela primeira vez pela face sul. Essa escalada é menos técnica, mas eu não acredito que seja mais fácil, porque às vezes morre mais gente. A parte sul eu acho mais bonita. Durante os acontecimentos dessa expedição, tive que tomar muitas decisões. Fui posta à prova, algumas vezes, em vários sentidos. Existe uma analogia com o empoderamento feminino, a liderança feminina, a questão de ser persistente, de ter a equipe certa ao seu lado. Não é o cume. É a jornada, o processo, aquilo que te transformou. 

E a relação com a natureza, a paixão pela natureza, é desde sempre? 

Sempre, desde sempre, tanto é assim que eu me formei médica, amo medicina porque amava ajudar as pessoas, mas eu estava completamente infeliz quando me formei. Estava infeliz porque ficava o tempo inteiro fechada, dentro do hospital, do centro cirúrgico, da clínica, do consultório, eu não via o sol se pôr, não via o sol nascer. Aí eu já tinha um problema, tive que arrumar a solução, a solução foi eu ir para os Estados Unidos e me tornar a primeira médica da América Latina a ter o Fellowship in Wilderness Medicine, que é a medicina de áreas remotas. Eu trouxe essa especialidade médica para o Brasil. Eu e mais alguns colegas fundamos a Abmar, que é a Associação Brasileira de Medicina de Aventura. A Abmar hoje está muito maior, está enorme, tem vários associados, cresceu muito, a gente está nas principais universidades do Brasil, mas quando a gente começou isso não tinha aqui. 

E o seu instituto? 

O Instituto da Dharma é um sonho, é a união da minha paixão com a minha profissão. Porque a minha profissão é a minha paixão nesses lugares de natureza, fazer o bem para as pessoas. Através do Instituto Dharma, consegui levar medicina especializada para quem mais precisa. Não há como pagar. Isso é realmente a realização de um sonho, ele está firme e forte. Eu hoje voltei para a parte que eu gosto. Eu estava na presidência, na diretoria, parte muito burocrática, administrativa, agora eu voltei a ser coordenadora médica e a pôr a mão na massa e atender voluntariamente nos lugares remotos. 

Como é ser referência?

Não me considero referência, mas se eu puder ser uma referência boa para alguém, para uma pessoa que seja, se o que eu falar entrar no coração de uma pessoa e fizer com que ela mude uma decisão errada ou que se inspire e se motive, já valeu a pena. 

O que mudou com a chegada da sua filha? 

Tudo. Primeiro que ela é o maior desafio. Quando perguntam o que é mais desafiador, eu respondo que é ter um filho. O ser humano não faz ideia do tamanho, do trabalho, da dedicação, da abdicação e da responsabilidade que é criar outro ser humano. Parece clichê, mas quando você tem é que você toma aquele chá de realidade.

Quantas viagens a sua filha já fez?

Ela tem um ano e meio e já foi para 13 países. Então, ela viaja bastante, mas claro que tirei bastante o pé do acelerador nas coisas muito perigosas, porque a gente não quer expor ela a grandes riscos. Mas, por exemplo, ela já foi até o campo base do Everest comigo quando ela tinha 7 meses e agora em outubro estou voltando para lá. Vou fazer um curso de medicina de altitude para 20 médicos e ela vai com a gente.

Então, como vai ser daqui a alguns anos, quando ela quiser acompanhá-la ou depois ir sozinha, já pensou nisso? 

É engraçado você me perguntar isso. O pai dela escalou o K2 comigo, que é a montanha mais perigosa e mortal do planeta. E um dia, quando estava grávida, questionaram a gente se nossa filha poderia escalar o K2. A gente respondeu na hora, juntos, sem olhar um para o outro: “Claro que não!”. De uma maneira muito espontânea, instantânea, sem pensar. Depois conversamos muito sobre isso. Nós sabemos dos riscos, mas se ela quiser, com certeza, vamos apoiar. Chegamos a conclusão de que o certo é apoiá-la. 

Não é simplesmente chegar e subir. Tem uma preparação?

Você não começa a dirigir um carro de Fórmula 1 e vai correr em Interlagos. Você começa a dirigir devagar, um veículo pequeno, um lugar tranquilo. E a montanha também é assim. Você começa a escalar montanhas menores. Vamos dando os passos pequenos até que um dia...


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