"Olha Pra Elas"

"Olha Pra Elas"

Documentário gaúcho expõe o universo feminino no sistema penitenciário brasileiro

Chico Izidro

Prisões precárias, abandono e desestruturação dos lares são os principais problemas enfrentados pelas apenadas

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Há muitos anos lendo um livro sobre o sistema penitenciário brasileiro, vi que as mulheres quando são presas e levadas ao presídio para cumprir pena são abandonadas totalmente pelos companheiros. O que já não acontece com os homens, mesmo na vida prisional, recebem visitas e até mesmo conseguem novas companheiras e até mesmo se casam. Retrato forte e cruel de nossa sociedade machista. 
Pois o documentário gaúcho "Olha Pra Elas", direção de Tatiana Sager e roteiro de Renato Dornelles e Luca Alverdi, expõe o universo feminino atrás das grades. Eles são os mesmos realizadores de "Central - o Poder das Facções no Maior Presídio do Brasil" (2017), que revelou as entranhas do Presídio Central de Porto Alegre. 
No documentário, é esmiuçado o cotidiano de mulheres que, em comum, têm de ser mães e viver longe dos filhos. Elas revelam histórias que, mesmo com suas especificidades, representam uma questão de gênero e identidade de mais de 40 mil brasileiras. Prisões precárias, abandono e desestruturação dos lares são os principais problemas enfrentados pelas apenadas.    
As grávidas ou lactantes, quando presas, convivem um período pré-definido com seus filhos - que, na primeira fase da vida passam encarcerados, como se tivessem herdado uma pena. Depois, juntamente com as crianças, elas enfrentam a traumática separação imposta, quando os bebês são entregues a um familiar ou, na falta destes, encaminhados a um abrigo.
Tatiana fala sobre o seu trabalho: "Os homens encarcerados sofrem principalmente pelo domínio que o crime organizado exerce dentro dos presídios masculinos, que acaba, muitas vezes, por escravizar o apenado, impossibilitando que ele retome uma vida honesta ao deixar a prisão. Esse domínio, por um lado,  faz com que os presos não fiquem desassistidos durante a permanência no cárcere, pois as facções criminosas suprem aquilo que o Estado deveria suprir e, depois, cobram através da exigência da prática de crimes", analisa. 
"As mulheres, ao contrário, sofrem com a falta de estrutura e de adequação das prisões para o universo feminino, sofrem com o abandono, pois não é comum as mulheres privadas de liberdade receberem visitas. Elas sofrem com o afastamento de suas famílias, principalmente dos filhos", explica a diretora.
O roteirista Renato Dornelles diz que "o sistema carcerário reproduz o comportamento machista da sociedade. Por isso, ele é tão identificado com o universo masculino. Um outro fator é que, aos poucos, a sociedade vai percebendo que os problemas do encarceramento masculino interferem diretamente na segurança pública, ou na falta dela, nas ruas. O filme Central mostrou isso", destaca. 
"Já o encarceramento feminino expõe, em geral, problemas familiares e sociais, que não provocam consequências diretas na vida de outras pessoas. É o caso dos filhos: quando as mães são encarceradas, muitas crianças acabam em abrigos, são separadas de irmãos e irmãs, ou acabam até abandonadas. Essas crianças só se tornam visíveis se, na adolescência, cometem um ato infracional ou, depois dos 18 anos, envolvem-se em crimes. Aí, o Estado e a sociedade passam a enxergá-las, mas com a intenção de encarcerá-las.  Por questões como essas, o encarceramento feminino ainda é tão pouco estudado e debatido", conclui ele. 
Trailer: https://www.youtube.com/watch?v=pJq41V2mTFE

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