Outra pandorga no céu

Outra pandorga no céu

O autor percebe a hora de buscar desafios, de encontrar e desbravar novas estradas, (...) a memória e a ficção, o real e o inventado.

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Se fosse um chefe farroupilha, iria juntar a tropa, mandava rufar tambores, e bem montado, no alto de uma coxilha do Rio Grande, faria o anúncio com honras militares. Se fosse um capataz de estância, iria reunir a peonada no final do dia ao redor de um fogo de chão, cevava um mate macanudo, dava umas duas ou três sorvidas, e exaltava a boa nova. Se fosse um peão campeiro, ia esperar cuidadosamente pelo domingo, vestiria a melhor pilcha e, antes de jogar a tava, atirava o pala nos ombros, e diria em versos que uma nova pandorga estava subindo ao céu azul desse nosso Estado gaudério. Porém, nada disso sou, na verdade apenas um humilde cronista, um guri bolicheiro que sonhou ser contador de causos e hoje está aqui, trazendo na mão outro livro: “Campereadas – Coração de pandorga”. 

Estou feliz e orgulhoso. “Coração de pandorga” está lindo, um livro meticulosamente editado pela Libretos, com supervisão da Clô Barcellos, nova parceira nesta tropeada literária. Mas aqui não poderia deixar de agradecer à Sulina, do Luis Gomes, que publicou meus três primeiros trabalhos. Mas precisei mudar para me reinventar e aviso, muitas novidades virão, porque um escritor não pode se fixar num modelo, numa única fórmula, mesmo que ela seja de aceitação popular. O autor percebe a hora de buscar desafios, de encontrar e desbravar novas estradas, novos posicionamentos, outras histórias, a memória e a ficção, o real e o inventado. Entendo que a realidade é sempre recuperada e, por isso, uma invenção. Assim, amigos, não existe mentira, só a verdade de cada um. Agradeço, ainda, ao Tailor Diniz, pela bela pintura que se tornou capa. 

Tive alguns momentos emocionantes na vida. Quando dona Mirica me beijou pela primeira e única vez, quando vi a cara de minha filha Paula ao nascer, quando o Inter foi campeão do mundo, quando o Walter Galvani disse que tinha me tornado um dos grandes jornalistas do Correio do Povo, quando me despedi de meu pai adotivo José Mendes, quando conheci meu pai biológico Donaldson Garschagen, quando escutava Roberto Carlos no rádio, sozinho e chorando em Júlio de Castilhos. Foram tantos momentos felizes ou tristes, mas reagia e dizia: sou forte, sinto que posso ser alguém. Sei escrever, versejar, fazer rimas, para alguma coisa sirvo. Para enfrentar o vestibular, busquei livros descartados, jornais e revistas, e escutei dicas nos programas das rádios de Santa Maria. 

Estou aqui, eu e minha arte. É tudo o que posso entregar a vocês meus amigos leitores. No livro está meu coração e minha alma. Guri, queria ser jogador de futebol, mas ao datilografar na Olivetti e ler para o pessoal no bolicho um causo, todos disseram que tinha que seguir escrevendo. Na época, contei a caçada que a mãe, a bolicheira, fez aos ladrões de uma ovelha. Ela deu de mão em um revólver Rossi, calibre 22, que falhou em todos os tiros. Todos riram e pediram para contar de novo. Histórias como esta têm várias, de memória, relatadas com a verve de um regionalismo revigorado. Causos de gente simples do campo, crônicas de um imaginário que ainda vive em nossos corações. 
Lançamento: 10 de novembro, às 18h, Feira do Livro de Porto Alegre. Pré-lançamento: Bar Parangolé (Lima e Silva, 240), 4 de outubro, às 18h. 


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