Polícia Civil investiga denúncia de crime de racismo contra Seu Jorge em Porto Alegre
Caso ocorrido durante apresentação na sexta-feira passada, no Grêmio Náutico União, está com a Delegacia de Polícia de Combate à Intolerância (DPCI)
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A Polícia Civil confirmou nesta terça-feira a abertura de um inquérito para apurar denúncia de crime de racismo cometido contra o cantor Seu Jorge, durante show realizado na sexta-feira passada no Grêmio Náutico União, em Porto Alegre. O caso está com a Delegacia de Polícia de Combate à Intolerância (DPCI), do Departamento Estadual de Proteção aos Grupos Vulneráveis (DPGV).
Em entrevista à reportagem do Correio do Povo, a titular da DPCI, delegada Andréa Mattos, explicou que o crime de racismo independe de representação da vítima, ao contrário, por exemplo, da injúria, que é ofensa à honra subjetiva da pessoa. “A gente começou a receber muitas denúncias”, justificou.
A investigação incluirá os depoimentos do artista, de testemunhas que estavam no show, da direção do clube, envolvidos na realização do show e dos organizadores do evento, além da busca e análise de imagens de câmeras de monitoramento e de telefones celulares, entre outras diligências.
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A delegada Andréa Mattos admitiu que poderá ser “difícil” identificar quem no público ofendeu o cantor, mas considerou que a discussão do caso em si é válida. “Independente de qualquer posicionamento que ele tenha feito no palco, não justifica que ele tenha sido chamado de macaco e que tenham sido emitidos sons parecidos com esse animal, em alusão à cor dele”, avaliou. “Na verdade, não ofende apenas ele, mas toda uma coletividade a partir do momento em que faz a comparação de uma raça com o animal”, observou.
“Um dos vídeos que recebi me parece que os xingamentos foram proferidos por pessoas que estavam próximas do palco. Eu queria muito que testemunhas nos procurassem, que ouviram ou filmaram. Espero que as imagens do clube dê para identificar”, afirmou a delegada Andréa Mattos, que já solicitou o material ao Grêmio Náutico União.
A titular da DPCI lembrou inclusive que as testemunhas, que gravaram os insultos ou saibam quem são os autores das ofensas, podem permanecer no anonimato “caso não queiram se envolver”.
Os contatos com a DPCI, que fica localizada na avenida Presidente Franklin Roosevelt, 981, no bairro São Geraldo, na Capital, podem ser feitos também pelo WhatsApp (51) 98595-5034 ou através do telefone (51) 3288-2570.
No final desta manhã, o governador Ranolfo Vieira Júnior garantiu que o inquérito da Polícia Civil terá "toda a isenção na apuração desse fato" e "vamos chegar a quem cometeu esses crimes".
Nota oficial
Em nota oficial, o Grêmio Náutico União informou que “está apurando internamente os fatos ocorridos em evento realizado no dia 14 de outubro, durante apresentação do cantor Seu Jorge” e assegurou que “se for comprovada a prática de ato racista, os envolvidos serão responsabilizados”.
“Afirmamos que o União, seguindo seu Estatuto e compromisso com associados e sociedade, repudia qualquer tipo de discriminação. Ressaltamos que Seu Jorge foi o artista escolhido para realizar show com a presença de associados e não associados do Clube considerando sua representatividade na cultura nacional e pelo reconhecimento internacional, e destacamos nosso respeito ao profissional e ao seu trabalho”, destacou o clube no comunicado assinado pelo presidente do Grêmio Náutico União, Paulo José Kolberg Bing.
Desabafo
O cantor Seu Jorge se manifestou na noite dessa segunda-feira pelas redes sociais, em especial no Instagram, sobre os atos racistas cometidos contra ele por parte da plateia no show ocorrido no Grêmio Náutico União. No vídeo, com pouco mais de nove minutos de duração, o músico aparece com uma bandeira do Rio Grande do Sul ao fundo. A repercussão do caso tornou-se nacional.
Antes de abordar o caso, Seu Jorge cumprimentou o povo gaúcho e reconheceu a cultura do Estado, que é composta por grandes nomes da música e literatura. Logo na sequência, o cantor inicia seu relato sobre o que presenciou ao longo da sua apresentação no local. Ele cita que, ao chegar ao clube, chamou atenção o fato de não haver a presença de negros na plateia, apenas as pessoas que trabalhavam no local. Depois, ele falou que escutou ofensas racistas que chegaram por parte do público presente.
“Na verdade, o que eu quero dizer aqui é que eu não reconheci a cidade que eu aprendi a amar e respeitar. Na verdade, o que eu presenciei foi muito ódio gratuito e muita grosseria racista”, declarou o cantor. Ao mesmo tempo, ele agradeceu ao carinho e mensagens de solidariedade que recebeu.
O músico pediu ao povo negro gaúcho que continue a lutar contra o racismo. “Estaremos na luta juntos denunciando e combatendo todo o tipo de tipificação da nossa gente e respondendo com excelência, preparo, coragem, sabedoria e diplomacia. Nunca, jamais, nos curvaremos ao racismo e à intolerância, seja ela qual for. Não cederemos um milímetro sequer ao ódio e combateremos e cobraremos das autoridades que a justiça prevaleça e os criminosos sejam devidamente punidos. A lei é para ser cumprida”, disse.