Ibama nega pedido da Petrobras para explorar petróleo na foz do rio Amazonas
Presidente do instituto seguiu orientação interna; caso tem sido motivo de discordância entre ministros de Lula
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O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) negou à Petrobras a licença de exploração de petróleo na bacia da foz do rio Amazonas. A decisão do presidente do Instituto, Rodrigo Agostinho, seguiu recomendação de técnicos da Diretoria de Licenciamento Ambiental do órgão, que apontaram "inconsistências técnicas" da empresa de petróleo. O parecer do instituto foi divulgado nesta quarta-feira (17).
O impasse envolve os ministros Marina Silva (Meio Ambiente e Mudança do Clima) e Alexandre Silveira (Minas e Energia), cujas pastas abarcam o Ibama e a Petrobras, respectivamente.
"Não restam dúvidas de que foram oferecidas todas as oportunidades à Petrobras para sanar pontos críticos de seu projeto, mas que este ainda apresenta inconsistências preocupantes para a operação segura em nova fronteira exploratória de alta vulnerabilidade socioambiental", destacou o presidente do Ibama no texto que negou a licença ambiental.
É a segunda vez que o Ibama nega pedidos da Petrobras para atividades de perfuração na região. Em 2018, o instituto não concedeu licença para cinco blocos sob controle da empresa.
O Ibama destacou ainda a "necessidade de se retomar ações que competem à área ambiental para assegurar a realização de Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) para as bacias sedimentares que ainda não contam com tais estudos e que ainda não possuem exploração de petróleo, no prazo mais breve possível".
O AAAS permite a identificação de áreas onde as atividades de extração e produção de petróleo e gás não pode ocorrer, devido a riscos de impactos ambientais.
A falta do documento complica a permissão, conforme explicou o Ibama. "A ausência de AAAS dificulta expressivamente a manifestação a respeito da viabilidade ambiental da atividade, considerando que não foram realizados estudos que avaliassem a aptidão das áreas, bem como a adequabilidade da região, de notória sensibilidade socioambiental, para a instalação da cadeia produtiva do petróleo."
De acordo com o Ibama, a região não passou pela avaliação. A bacia da foz do Amazonas é considerada de extrema sensibilidade socioambiental, porque abriga unidades de conservação, terras indígenas, mangues, biodiversidade marinha com espécies ameaçadas de extinção — como boto-cinza, boto-vermelho, cachalote, baleia-fin, peixe-boi-marinho, peixe-boi-amazônico e tracajá.
Entenda o caso
Relatórios do Ibama trazem o histórico da tentativa de licenciamento da área, conhecida como Bloco FZA-M-59. O processo foi iniciado em 2014, quando a concessão da área era administrada pela britânica BP em parceria com a Petrobras.
O bloco era um dos 12 localizados na foz do rio Amazonas e que foram concedidos à exploração na época. Até hoje, no entanto, nenhum deles obteve licença de operação para a perfuração de poços. O Ibama apontou em outros relatórios iniciais pendências nos planos das empresas interessadas.
Em 2021, a empresa britânica desistiu da concessão do FZA-M-59 e a Petrobras assumiu o negócio por inteiro. Desde setembro de 2021, a companhia tem manifestado interesse no licenciamento, mas o Ibama vem reforçando que existem pendências.
O R7 teve acesso a um dos relatórios produzidos pelo instituto, que pede que o caso seja arquivado. O texto fala em "inconsistências identificadas sucessivamente" e "limitações técnicas e logísticas envolvidas nas operações" e pede "avaliações mais amplas e aprofundadas".
Segundo o documento, os países vizinhos ao Brasil serão diretamente afetados em caso de vazamento de óleo. "A deriva do óleo para pequenos e médios vazamentos atingiria as águas fora do território brasileiro em até 10 horas e, em 15 horas, no caso de um grande vazamento", diz trecho. "Esses tempos tão diminutos expõem a necessidade de uma organização internacional para atendimento à resposta transfronteiriça", completa o documento.
Reuniões e conflitos
O presidente do Ibama conversou por telefone com o ministro de Minas e Energia no fim de abril. "Ele me ligou para saber como estava o processo de licenciamento. Foi uma conversa bastante tranquila", contou Agostinho à reportagem.
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, discutiu a questão com o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, em 30 de março. Dias antes, em entrevista a um portal de notícias, Marina afirmou que a estatal deveria parar de explorar petróleo e que está olhando para esse desafio na foz do rio Amazonas do mesmo jeito que olhou para Belo Monte.
"A minha opinião pessoal é de que a Petrobras não pode continuar como uma empresa de exploração de petróleo. Ela tem que ser uma empresa de energia que vai usar, inclusive, o dinheiro do petróleo para fazer essa transição, para deixar essa fonte que é altamente impactante para o equilíbrio do planeta", defendeu a ministra.
A Usina de Belo Monte, próxima ao município de Altamira (PA), foi o motivo de um dos atritos que Marina teve com os colegas na época em que chefiou a pasta do Meio Ambiente no segundo mandato de Lula, em 2008, e que resultou na saída da ministra.