Porto Alegre 250 anos: 1822-1872, uma guerra e uma cidade

Porto Alegre 250 anos: 1822-1872, uma guerra e uma cidade

Foi nesta da época que aconteceu a Guerra dos Farrapos, de 1835 a 1845

Christian Büeller

Obras do Theatro São Pedro foram finalmente concluídas em junho de 1858.

publicidade

Ao fim do período colonial, em 1822, a vila ganhou foro de cidade, na abertura do período imperial. A partir de então, chegaram os primeiros imigrantes alemães, instalando restaurantes, pensões, pequenas manufaturas, olarias, alambiques e diversos estabelecimentos comerciais. “A Província se abastece de couros, crina, chifres de gado que vêm de outras regiões do Brasil”, aprofunda o professor e pesquisador da PUCRS, pós-doutor em História Social e Cultural da Arte, Charles Monteiro. É uma época em que se popularizam os largos, espaços de reunião e sociabilidade, como o Largo da Quitanda (atual Praça da Alfândega), o Largo dos Ferreiros (hoje Praça Montevidéu), Largo do Arsenal (atual Praça Brigadeiro Sampaio) e o Pelourinho (Igreja das Dores). “Festas religiosas e atividades da milícia ocorriam nestes locais”, acrescenta o professor.

É nesta da fase em que acontece a Guerra dos Farrapos (de 1835 a 1845), como resultado da insatisfação econômica e política, que culminou em uma série de desentendimentos com o governo central. “Em um primeiro momento, os Farrapos conquistam Porto Alegre e se apossam da cidade, meses depois retomada pelas Forças Imperiais. A Capital assiste a conflitos, como o famoso Combate dos Tamancos, entre a Ponte da Azenha e a Várzea. Porto Alegre se mantém valorosa e leal ao Império”, explica Monteiro. Em meio à guerra, uma nova fortificação é levantada em torno da cidade e concentra a ocupação dentro de um território localizado na península às margens do Guaíba. “Por isso, o Centro Histórico é essa referência identitária tão forte para aquela região”, enfatiza o historiador.

Retomada

Com o fim da Guerra dos Farrapos, também são derrubadas as fortificações e melhora a comunicação com o Sul da cidade. “Começa uma expansão para além daquele espaço concentrado na ponta da península. A ocupação se dá em direção à Cidade Baixa”, relembra Monteiro. A reativação da economia local tem a contribuição do porto da cidade para a circulação de pessoas e bens pela Província. Se inicia um processo de ampliação da cidade à custa do lago, com a construção de sucessivas benfeitorias e aterros no litoral. Fundada em 1803 como Hospital da Caridade de Porto Alegre, a Santa Casa de Misericórdia se torna peça fundamental da retomada porto-alegrense pós-guerra. Além de atender os doentes, pobres, órfãos e os expostos (crianças abandonadas pelos genitores), ofereceu assistência aos feridos dos conflitos. No entanto, no período mais trágico desta época, a Capital teve como inimigo a cólera. A epidemia irrompeu a cidade em 1855, tirando mais de 1,4 mil vidas, o que se repetiria dez anos depois, mas com menor número de mortes.

Um sonho de teatro

Em 1833, o presidente da província Manoel Antônio Galvão doou um terreno no centro de Porto Alegre para o início das obras do Theatro São Pedro, sonhado desde os tempos coloniais, que seriam feitas com projeto arquitetônico no estilo neoclássico do arquiteto Filipe Normann. Mas, com o início da Revolução Farroupilha em 1835, a obra foi suspensa, sendo retomada anos depois. Finalmente, dia 27 de junho de 1858 o prédio foi inaugurado sob a presidência de Ângelo Moniz da Silveira Ferraz, o Barão de Uruguaiana.

Água daquele jeito

No ano de 1865 foi fundada a Hidráulica Porto-Alegrense, que passou a fornecer água a domicílio para as elites e, nos chafarizes públicos, para a população. “A água não era de muito boa qualidade porque as gazetas locais da época falavam que era marrom, tinha cheiro e gosto desagradável”, recorda o professor Charles Monteiro. O primeiro chafariz público da cidade era feito com uma escultura de ferro fundido. A peça foi trazida diretamente da França pelo escultor Albert Carrier Belleuse.

O dia em que o imperador veio a Porto Alegre

Também em 1865 aconteceu a visita do imperador Dom Pedro II, acompanhado da princesa Isabel e do Conde d'Eu, para monitorar as operações militares da Guerra do Paraguai, ocorrida entre 1864 e 1870. “Várias ruas acabam recebendo nomes relacionados à família imperial. A Praça Conde d'Eu, que seria a Praça XV de Novembro, a Rua da Imperatriz, a Rua do Imperador e uma série de denominações comemorativas”, diz o professor. É criada uma via em homenagem àqueles que se dispuseram a lutar na guerra: a rua Voluntários da Pátria. “Mas, na verdade, eles não foram muito voluntários, alguns deles saíram algemados daqui”, desmistifica Monteiro. Segundo o historiador, a partir daí começa uma série de iniciativas que, aos poucos, ajudam a modernizar a cidade. Uma delas, a criação do Mercado Público.

O primeiro e o segundo Mercado

Até a segunda administração de Saturnino de Souza e Oliveira, entre 1841 e 1842, Porto Alegre ainda não dispunha de um mercado central, e o comércio era distribuído por vários pequenos estabelecimentos espalhados pela cidade. Foi então constituída uma sociedade para a construção de um prédio adequado, localizado na antiga Praça do Paraíso (Praça XV de Novembro). “Ficava do outro lado, não onde está hoje”, lembra Monteiro. Em 1845, foram iniciadas discussões para construção de um novo prédio, mais amplo e moderno.

O projeto do engenheiro Frederico Heydtmann, previa um só pavimento. Em forma de quadrilátero, com torreões nas esquinas e um pátio central. Sempre sob a responsabilidade do poder público municipal, o Mercado Público foi fundado em 1869 e logo se tornou o maior e principal centro de abastecimento da cidade. A obra custou aos cofres públicos a importância de 246 contos de réis, bastante elevada para a época. Até hoje, figura como um dos pontos principais da cidade.


Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895